2012 Dissertacao Erika

1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ NÚCLEO DE MEIO AMBIENTE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GESTÃO DOS RECURSOS NATURAIS E DESE...

0 downloads 82 Views 3MB Size
1

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ NÚCLEO DE MEIO AMBIENTE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GESTÃO DOS RECURSOS NATURAIS E DESENVOLVIMENTO LOCAL NA AMAZÔNIA (PPGEDAM)

ÉRIKA SIMONE DA SILVA BENTES

ASPECTOS SOCIAIS E NATURAIS DE UM PROBLEMA AMBIENTAL: UM ESTUDO NA ILHA DA COROA COMPRIDA, AMAZÔNIA ORIENTAL.

Belém/ PA 2012

2

ÉRIKA SIMONE DA SILVA BENTES

ASPECTOS SOCIAIS E NATURAIS DE UM PROBLEMA AMBIENTAL: UM ESTUDO NA ILHA DA COROA COMPRIDA, AMAZÔNIA ORIENTAL.

Dissertação apresentada como requisito final para obtenção do grau de Mestre em Gestão dos Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia. Núcleo de Meio Ambiente, Universidade Federal do Pará. Linha de Pesquisa: Gestão Ambiental. Orientador (a): Prof. (a) Dra. Sônia Maria Simões Barbosa Magalhães Santos. Coorientador: Prof. Dr. Breno Cesar de Oliveira Imbiriba.

Belém/ PA 2012

3

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) Biblioteca Central da UFPA- Belém- PA

Bentes, Érika Simone da Silva Aspectos sociais e naturais de um problema ambiental: Um estudo na ilha da coroa comprida, Amazônia oriental / Érika Simone da Silva Bentes. – 2012.

Orientadora: Sônia Maria Simões Barbosa Magalhães Santos Co-Orientador: Breno Cesar de Oliveira Imbiriba

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Pará, Núcleo de Meio Ambiente, Programa de Pós-graduação em Gestão dos Recursos Naturais e Desenvolvimento local na Amazônia (PPGEDAM), 2012.

1. Avaliação de riscos ambientais - Augusto Corrêa (PA). 2. Impacto ambiental- Augusto Corrêa (PA). 3. Solos- Erosão- Augusto Corrêa (PA). I. Título. CDD 22. ed.: 363.70098115

4

ÉRIKA SIMONE DA SILVA BENTES ASPECTOS SOCIAIS E NATURAIS DE UM PROBLEMA AMBIENTAL: UM ESTUDO NA ILHA DA COROA COMPRIDA, AMAZÔNIA ORIENTAL.

Dissertação apresentada como requisito final para obtenção do grau de Mestre em Gestão dos Recursos Naturais e Desenvolvimento Local do Núcleo de Meio Ambiente, Universidade do Federal do Pará, orientada pela Prof. (a) Dra. Sônia Maria Simões Barbosa Magalhães Santos e coorientada pelo Prof. Dr. Breno Cesar de Oliveira Imbiriba. Linha de Pesquisa: Gestão Ambiental.

Defendido e aprovado em: ______/______/_______ BANCA EXAMINADORA: _________________________________ Dra Sônia Maria Simões Barbosa Magalhães Santos - Orientadora Universidade Federal do Pará (UFPA) _________________________________ Dra. Maria de Nazaré Ângelo-Menezes – Examinador Interno Universidade Federal do Pará (PPGEDAM/UFPA) _________________________________ Dra. Maria José Aquino Teisserenc – Examinador Externo Universidade Federal do Pará (PPGCS/UFPA)

Belém/ PA 2012

5

Dedico a meus familiares, em especial a minhas mães: Normélia, Edilene e Euzinete que contribuíram para minha formação.

6

AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, por ter me permitido participar dessa Família maravilhosa que me concedeu amor e carinho e ensinamentos suficientes que me trouxeram a essa jornada. A minha querida orientadora, Dra Sônia Barbosa Magalhães, por me propor esse tema de dissertação, que me proporcionou um novo olhar da realidade social, e por se propor a me explicar os diversos assuntos que não faziam parte do meu dia-a-dia. Ao professor Breno Imbiriba que concordou em ser meu coorientador, e contribui com sua sabedoria, confiabilidade e compreensão para atingirmos o objetivo proposto. As minhas irmãs Edilene e Euzinete e Heliana, que são os exemplos de minha vida, e a meus amores: Julio e Ingrid, Diego e Amanda. Aos amigos e amigas que acreditaram em meu potencial. Em especial minhas amigas: Nídia, Nona e Marcela; e minha amiga Ms Ynis que me mostrou o caminho árduo para o mestrado, e vem se mostrando paciente com minha ansiedade até a defesa de minha dissertação. Ao meu querido amigo Pedro por ser presente em minha vida e me amparar nessa jornada, aceitando ficar com minha mãe nos momentos de minha ausência. A Sheila e Nanda por se fazerem presentes em minha vida nesse momento e por me proporcionarem conhecer meu novo amigo Anderson Góes, que me ajudou a organizar e formatar o presente trabalho. Aos professores do Curso de Mestrado em Gestão dos Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia, pelo aprendizado compartilhado. A todos os colegas de mestrado da turma de 2010, pelas produtivas discussões acadêmicas e pelas diversas comemorações. Especialmente as colegas que se tornaram minhas amigas: Rosângela, Geiza, Tatiana, Sheila e Nircele que se mostraram amigas de verdade, nos momentos mais difíceis enfrentados por mim no decorrer do mestrado. Aos funcionários da secretaria do NUMA, Claudio e Zelma, pela paciência e amizade. Aos moradores da ilha da Coroa Comprida que me permitiram fazer esse trabalho de pesquisa, em especial seu Almir e sua família. Meu muito obrigado! A todos que direta ou indiretamente me auxiliaram nessa jornada.

7

“o ser humano está no centro desse processo e duplamente exposto, seja em razão da destruição progressiva de ecossistemas e da biodiversidade de que depende, seja pelo desaparecimento dos territórios onde vive, provocado pela desertificação, pela elevação do nível dos oceanos, pelo derretimento dos gelos ou erosão”. (LE MONDE DIPLOMATIQUE BRASIL. Atlas do Meio Ambiente, 2010, p. 44).

8

RESUMO A região amazônica se destaca no cenário mundial não apenas pela sua biodiversidade, por conter a maior floresta tropical ainda existente do mundo, mas também pela sua sociodiversidade: a região contém distintos grupos populacionais. Este trabalho discute a problemática da construção social do problema ambiental a partir do conhecimento e da percepção local do fenômeno, apoiado em observação e entrevistas. A pesquisa se desenvolve na Ilha da Coroa Comprida, mesorregião do Salgado, onde se encontra uma comunidade basicamente constituída de pescadores, situada na foz do rio Urumajó, sob influência direta do Oceano Atlântico. Esta localidade tem enfrentado um extenso processo de erosão hídrica que vem diminuindo significativamente a extensão territorial da praia onde habitam os moradores da ilha, provocando o seu deslocamento tanto para outros locais ao longo do rio quanto para a periferia da cidade de Augusto Corrêa. Das aproximadamente 400 famílias que habitavam a ilha originalmente, apenas 15 permanecem neste momento e devido apenas à falta de condições financeiras para se deslocarem. Os moradores que já se deslocaram da ilha, foram para locais diversos: casa de parentes na sede do município, para a vila de Perimirim que foi construída há 36 anos para abrigar exatamente os deslocados da Ilha da em questão, devido ao processo de erosão que já se iniciara deste então. Outra parcela de moradores foi transferida para o bairro Bom Jesus nas proximidades da sede do município. Os últimos 15 moradores aguardam o termino da construção de 25 casas construídas pela prefeitura do município para abrigar as vítimas do processo de erosão. Tanto os pescadores quanto os gestores públicos interpretam a erosão como um "fenômeno natural", e não há políticas públicas voltadas para a população que vive a destruição do território e o deslocamento compulsório. Como esta erosão hídrica é tratada como fenômeno natural, seus efeitos não são incluídos nas discussões atuais sobre medida de prevenção dos riscos ambientais e de proteção das vítimas de desastres ambientais. Palavras-chave: Augusto Corrêa; desastres ambientais; deslocamento compulsório; erosão hídrica; riscos ambientais.

9

ABSTRACT The Amazon region is highlighted on the world stage not only for its biodiversity, it contains the largest rainforest in the world still existing, but also for its social diversity: the region contains distinct population groups. This paper discusses the problem of the social construction of environmental problem from the knowledge and the local perception of the phenomenon, supported by observation and interviews. The research develops the Island Coroa Comprida, mesoregion Salgado where a community made up mostly of fishermen, situated at the mouth of the river Urumajó under the direct influence of the Atlantic Ocean. This town has faced a long process of erosion that is declining because the territorial extension of the beach where the locals inhabit the island, causing its movement to other locations both along the river and to the outskirts of Augusto Corrêa. Of the approximately 400 families that originally inhabited the island, only 15 remain now and only due to lack of financial resources to travel. Residents who have already moved the island, went to several places: home of relatives in the county seat, to the village of Perimirim which was built 36 years ago to house the displaced exactly the Island in question, due to the erosion process that had begun since. Another portion of residents moved to the neighborhood Bom Jesus Near the center of the municipality. The last 15 residents await the end of the construction of 25 houses built by the City Hall to house the victims of the erosion process. Both fishermen as public managers interpret erosion as a "natural phenomenon", and no public policies for the population living in the territory and the destruction compulsory displacement. As this erosion is treated as a natural phenomenon, its effects are not included in current discussions on measurement of risk prevention and environmental protection of victims of environmental disasters. Keywords: Augusto Corrêa; environmental disasters; compulsory displacement, erosion, environmental risks.

10

LISTA DE ILUSTRAÇÕES Gráfico Gráfico Gráfico Gráfico

1 2 3 4

Imagem

1

Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem

2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem

13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23

Mapa Mapa

1 2

Mapa Mapa Mapa

Quadro

3 4 5

1

Aumento dos desastres naturais e da população mundial (1900 – 2000)-------------------------------------------------------------------------Desastres naturais mais recorrentes no Pará-----------------------------Frequência mensal de erosão fluvial no estado do Pará, período de 1991 a 2010-----------------------------------------------------------------Danos humanos ocasionados por erosão fluvial no estado do Pará, período de 1991 a 2010-----------------------------------------------------

46

47 65 66

Conversas informais com Moradores da ilha da Coroa Comprida --Conversas com família de pescadoras da ilha --------------------------Porto banhado pelo rio Urumajó ----------------------------------------Características da Ilha da Coroa Comprida -----------------------------Casas remanescentes na ilha ---------------------------------------------Rancho na Ilha da Coroa Comprida -------------------------------------Posto de Saúde da Ilha da Coroa Comprida----------------------------Escola Municipal da Ilha da Coroa Comprida--------------------------Igreja Abandonada---------------------------------------------------------Erosão fluvial no mês de janeiro de 2011-------------------------------Erosão fluvial no mês de novembro de 2011---------------------------Casas destinadas a 25 famílias em processo de construção no bairro Bom Jesus antigo Mirreli--------------------------------------------------Imagens da ilha da Coroa Comprida Satélite Landsat 5---------------Recorte de Imagem da ilha da Coroa Comprida ano 2007------------Recorte de Imagem da ilha da Coroa Comprida ano 2011------------Características da Vila de Perimirim-------------------------------------Processo de erosão fluvial na Vila de Perimirim-----------------------Casas do Bairro Bom Jesus às proximidades da sede administrativa. Pequeno porto próximo às casas do Bairro Bom Jesus----------------Construção casas: Bom Jesus---------------------------------------------Casas já ocupada------------------------------------------------------------Escavação de fossa seca --------------------------------------------------Construção de poço aberto ------------------------------------------------

20 20 25 29 31 32 35 36 37 69 70

Mesorregião do Nordeste Paraense -------------------------------------Vilas pesqueiras de Augusto Corrêa na área de influência da APA da costa de Urumajó ------------------------------------------------------Artes de Pesca de Augusto Corrêa --------------------------------------Adaptado de desastres naturais causados por erosão fluvial e movimento de massa no estado do Pará, período de 1991 a 2010--Mapa de deslocamento interno de moradores da ilha da Coroa Comprida---------------------------------------------------------------------

23

Notícias do jornal O Liberal e da página da ORM (Organização Rômulo Maiorana) on line sobre a Ilha da Coroa Comprida e o fenômeno da erosão hídrica------------------------------------------------

74 82 83 83 85 85 86 86 86 86 87 87

20 26 68 88

61

11

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Tabela 2 Tabela 3 -

Portarias de Situação de Emergência (SE) e Estado de Calamidade Pública (ECP)-------------------------------------------------------------------Desastres ocorridos no estado do Pará notificado à Defesa Civil nos anos de 2007, 2008, 2009, 2010----------------------------------------------Municípios atingidos por erosão fluvial no estado do Pará, período de 1991 a 2010-----------------------------------------------------------------------

48 49 67

12

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ACNUR AP APA AVADAN CODAR CSVM ECP EM-DAT GPS IBAMA IBGE IDESP MI NOPRED NUMA ONGs ONU ORM PNGC PNGR PNUMA RIMA SE SEMA SEMMA SEMOB SEMTEPS SEPOF SINDEC UFPA

Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados Área Protegida Área de Proteção Ambiental Formulário de Avaliação de Danos Codificação dos Desastres Ameaças e Riscos Cátedra Sérgio Vieira de Mello Estado de Calamidade Pública Emergency Events Database Global Positioning System Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Instituto de Desenvolvimento Econômico, Social e Ambiental do Pará Ministério de Integração Nacional Notificação Preliminar de Desastres Núcleo de Meio Ambiente Organizações não governamentais Organização das Nações Unidas Organizações Rômulo Maiorana Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro Planejamento Nacional para Gestão de Riscos Programa das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Relatório de Impacto Ambiental Situação de Emergência Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Pará Secretaria Municipal de Meio Ambiente Secretaria Municipal de Obras e Serviços Urbanos Secretaria Municipal de Trabalho, Economia e Promoção Social Secretaria de Estado de Planejamento, Orçamento e Finanças Sistema Nacional de Defesa Civil Universidade Federal do Pará

13

SUMÁRIO

II

III

INTRODUÇÃO----------------------------------------------------------------------1.1 METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS---------------

14 17

CAPÍTULO II – ILHA DA COROA COMPRIDA – AUGUSTO CORRÊA / PA ------------------------------------------------------------------------2.1 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO -------------------------------2.1.1 Localização do Município de Augusto Corrêa ----------------------2.2 ASPECTOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E AMBIENTAIS DO MUNICÍPIO 2.3 LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA ILHA DA COROA COMPRIDA-----------------------------------------------------------

21 21 21 25

CAPÍTULO III - FENÔMENO NATURAL/ DESASTRE AMBIENTAL 3.1 QUANDO O FENÔMENO NATURAL SE TRANSFORMA EM DESASTRE ---------------------------------------------------------------------------3.2 OS DESASTRES NATURAIS E OS BANCOS DE DADOS MUNDIAIS -3.2.1 Situações de Desastre no Estado do Pará ---------------------------3.3 CONCEITO DE RISCO EM SISTEMAS NATURAIS-------------------------3.3.1 Risco natural---------------------------------------------------------------3.3.2 Risco social------------------------------------------------------------------3.3.3 Vulnerabilidade------------------------------------------------------------3.4 REFUGIADOS AMBIENTAIS ----------------------------------------------------

IV 4.1 4.2

4.3 4.4 4.5

V

DESCRIÇÃO DO FENÔMENO DO PONTO DE VISTA GEOFÍSICO (IMAGEM DE SATÉLITE)-------------------------------------------------------SURGIMENTO DO FENÔMENO DE EROSÃO NA MÍDIA LOCAL------DESCRIÇÃO DO FENÔMENO DO PONTO DE VISTA GEOFÍSICO-----4.2.1 Erosão Fluvial – o desastre que ocorre na área de estudo--------4.2.2 Erosão Fluvial no estado do Pará-------------------------------------4.2.3 Erosão Fluvial no município de Augusto Corrêa – Ilha da Coroa Comprida----------------------------------------------------------DESCRIÇÃO DO FENÔMENO A PARTIR DO PONTO DE VISTA DO PODER PÚBLICO-------------------------------------------------------------------DESCRIÇÃO DO FENÔMENO A PARTIR DO PONTO DE VISTA DOS MORADORES DA ILHA----------------------------------------------------------ANÁLISE TEMPORAL DAS IMAGENS DE SATÉLITE - ILHA DA COROA COMPRIDA----------------------------------------------------------------

27 41 41 43 46 50 53 53 54 55

60 60 62 62 65 66 70 75 80

AS SOLUÇÕES---------------------------------------------------------------------5.1 AS SOLUÇÕES DOS PRÓPRIOS MORADORES-----------------------------5.1.1 O deslocamento------------------------------------------------------------5.2 AS SOLUÇÕES DO PODER PÚBLICO------------------------------------------

84 84 84 89

REFLEXÕES CONCLUSIVAS---------------------------------------------------

91

REFERÊNCIAS CONSULTADAS----------------------------------------------ANEXOS-------------------------------------------------------------------------------

94 100

14

1.

INTRODUÇÃO

O tema desta pesquisa está inserido em Projeto de Pesquisa coordenado por minha orientadora, intitulado “Usos Sociais da Água”, que tem como um de seus objetivos: analisar a relação entre a construção social dos direitos e modos de vida, por meio do estudo da construção de categorias políticas de defesa de direitos e cidadania, como, por exemplo, deslocamento forçado, atingido e refugiado ambiental, tendo como referência o debate que se desenvolve na Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. A elaboração desse projeto de pesquisa relaciona-se a um prévio interesse pelas discussões ambientais, advindos desde a graduação, o que possibilitou meu ingresso no Curso de Mestrado em Gestão dos Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia e em outro curso de graduação: Engenharia Sanitária e Ambiental, os dois na Universidade Federal do Pará – UFPA. Esse foi um dos aspectos que nos motivou a elaboração da pesquisa, que se baseou em conhecimentos multidisciplinares o que nos consentiu apreender a precisão de mais pesquisas acerca de questões relacionadas com a biodiversidade amazônica e também com sua sociodiversidade. Esse trabalho foi realizado na Ilha da Coroa Comprida, localizada no município de Augusto Corrêa, município do Estado do Pará, que vem sofrendo um forte processo de erosão hídrica. Este processo, que se estende há mais de três décadas, tem motivado o deslocamento compulsório das famílias moradoras da ilha, que tem buscado soluções próprias e “ajuda” do poder público local para enfrentar a situação de desastre por eles vivida. Sendo assim, utilizo então, o conceito de deslocamento compulsório adotado por Magalhães (2007, p.14): “Por deslocamento compulsório estou designando o processo pelo qual determinados grupos sociais, em circunstâncias sobre as quais não dispõem de poder de deliberação, são obrigados a deixar ou a transferir-se de suas casas e/ou de suas terras.” Os deslocamentos populacionais tem se mostrado cada vez mais frequentes em várias partes do mundo, atualmente podemos assistir e compartilhar essas informações graças ao avanço dos sistemas informacionais e de comunicação (rádio, tv e internet entre outros). Curiosamente, a causa de muitos desses deslocamentos está relacionada a desastres originados por fenômenos naturais como secas, chuvas, inundações, deslizamentos de terras e erosões, que dentre outras consequências esses fenômenos proporcionam à população uma migração forçada. O que pode ser confirmado segundo o texto de Atlas do Meio Ambiente (2010, p. 44) “Por toda parte, comunidades, povos e nações vêem-se confrontados com a perspectiva de

15

uma migração forçada.” Ainda segundo o autor a causa de tais deslocamentos esta relacionada ao “desaparecimento definitivo de recursos naturais e territórios, o aquecimento global ameaça provocar deslocamentos cada vez mais maciços das populações”. Nessa perspectiva, podemos dizer que a recorrência desses desastres tem ocasionado à ampliação de discussões de vários processos dentre eles o processo de erosão. Uma vez que, processos similares de erosão têm ocorrido em outras partes do mundo e motivado uma discussão de âmbito internacional, do ponto de vista jurídico quanto social, sobre a natureza do problema e a natureza da solução. Mas, é principalmente com a controvérsia em torno das categorias “desastre” ou “catástrofe” que este trabalho se relaciona. Nesta discussão, coloca-se a oposição entre desastre natural e desastre provocado pelo homem, estando em jogo, principalmente, uma questão política: a definição do que é problema ambiental e de quem é a responsabilidade de sua solução. Na definição de problema ambiental, insere-se uma gama de questões e de ações que buscam demonstrar que, tanto nas catástrofes naturais quanto nos desastres ambientais provocados pelo homem (projetos de desenvolvimento, mudanças climáticas, entre outros), as consequências para as populações são similares. Pergunta-se, também, até que ponto as catástrofes naturais não seriam, também elas, decorrentes de prévias intervenções humanas sobre o meio ambiente? O corolário seguinte completa o eixo da discussão: a “catástrofe natural” não é causada pelo homem e demanda soluções do tipo “ajuda humanitária”; e o “desastre ambiental” é provocado pelo homem e demanda soluções de tipo “político” e “econômico”. É indispensável ressaltar que a Constituição Brasileira de 1988, trás o art. 225, Capítulo 6 do Título VIII, que dispõe do direito ao meio ambiente, citada a seguir: “Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (BRASIL, 1988). Assim sendo, a Carta Magna reza que é obrigação do Estado Brasileiro, ou seja, de todas as entidades federais e também dos atores sociais defenderem e, sobretudo, preservarem o meio ambiente, cabendo ao Poder Público à competência de instituir políticas públicas que primem pelos seguintes compromissos: preservação e conservação do meio ambiente. Partiu-se do princípio de que a definição de uma situação é dada pela sociedade. Portanto, depende do modo como a sociedade percebe um fato e o classifica. Conforme Raiol (2010, p.19) “De certo modo, algumas das devastações naturais que atingiram assustadoramente o planeta, nos últimos anos, guardam relação com a atividade humana sobre

16

a terra.” De acordo com o autor, o crescimento da população humana e a ocupação desordenada do território potencializam os problemas ambientais. Hoje em dia, há um cenário com diversos acontecimentos que devem estimular as reflexões acadêmicas a respeito desse tema: desastres ambientais como secas, inundações, furacões, terremotos, chuvas entre outros, são recorrentes nos últimos tempos em diversos locais do mundo. Assim, procuramos elaborar a partir dos pontos de vista dos atores envolvidos como se dá a construção social do fato ocorrido na ilha e analisar a natureza das soluções encontradas pelos atores sociais para enfrentá-lo. O empenho da atual dissertação é, portanto, demonstrar como é socialmente construído, explicado e vivenciado o fenômeno ambiental e o deslocamento compulsório por ele provocado na Ilha de Coroa Comprida. Diante do exposto, apresentamos os seguintes Objetivos Específicos:  Analisar qual o destino dado às famílias deslocadas compulsoriamente da Ilha da Coroa Comprida em decorrência de fenômeno natural. Com anseios em identificar:  Verificação através de imagens de satélites a efetiva diminuição do território da praia decorrente do processo de erosão hídrica. A ilha integra a zona costeira do nordeste paraense e sofre influência direta do Oceano Atlântico, apresentando em longo prazo a dilapidação de sua paisagem pelo processo de erosão. Processo esse que tem causado a diminuição do território da praia, o deslocamento compulsório de seus habitantes e a migração para a periferia na sede do município. No que diz respeito ao poder local, as suas ações são vistas pelos deslocados como incipientes e/ou pontuais e não têm contribuído para a sua reprodução social e econômica. A opção de análise, diante da problemática do trabalho, nos levou a autores da bibliografia sociológica nacional e internacional, tal arcabouço fundamentou o presente trabalho com o livro “Sociologia dos desastres: Construção, Interfaces e Perspectivas no Brasil” de Valencio et al. (2009) e autores que desenvolvem a idéia de “Sociedade de Risco”. Como Egler (1996), Villagran de León (2002) e Anthony Giddens, Ulrich Beck, Scott Lash, entre outros, pois os mesmos desenvolvem suas argumentações com elementos fundamentais para a compreensão do conceito de risco e desastre, com questionamentos sobre a ausência de controle das consequências ocasionadas pelos processos de modernização da sociedade, consequências essas ambientais e sociais dentre outras.

17

Certamente podemos afirmar que as questões relacionadas com as problemáticas de risco e deslocamento compulsório por mudanças ambientais são intimamente associadas com o processo de apropriação do território pela sociedade e sua relação com o mesmo. Trabalhamos com duas hipóteses. A primeira é de que os problemas ocasionados aos moradores em questão são percebidos tanto por eles como pelo poder local como fenômenos naturais para os quais não há medidas de controle e prevenção. A segunda hipótese é de que a ausência de políticas públicas específicas agrava as consequências do problema, despolitiza-o e reafirma mais ainda a situação de vulnerabilidade social dessas vítimas.

1.1 METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O enfoque predominante na pesquisa foi estabelecido com as proposições da pesquisa Qualitativa. A escolha dessa metodologia repousa no que diz Lakatos, Marconi (2007, p. 269) “A metodologia qualitativa preocupa-se em analisar e interpretar aspectos mais profundos, descrevendo a complexidade do comportamento humano. Fornece análise mais detalhada sobre investigações, hábitos, atitudes, tendências de comportamento etc.”. Optamos por essa metodologia, pois o caráter da pesquisa está relacionado com a interpretação de fenômenos ambientais e suas consequências aos indivíduos. Pois, conforme mencionado anteriormente o objetivo da dissertação é demonstrar como é socialmente construído e vivenciado o fenômeno ambiental e o deslocamento compulsório por ele provocado na ilha da Coroa Comprida. E para atingirmos tal objetivo, partimos do princípio do que diz Lakatos, Marconi (2007, p. 272) “Por meio do método qualitativo, o investigador entra em contato direto e prolongado com o indivíduo ou grupos humanos, com o ambiente e a situação que está sendo investigada, permitindo um contato de perto com os informantes”. Os critérios utilizados para a elaboração da pesquisa levam em consideração que o tema é relativamente novo, por esse motivo a pesquisa é predominantemente qualitativa identificada como um Estudo de Caso que para Lakatos, Marconi (2007, p. 274) “refere-se ao levantamento com mais profundidade de determinado caso ou grupo humano sob todos seus aspectos”. Conforme os autores, podemos dizer que o estudo de caso “reúne o maior número de informações detalhadas, valendo-se de diferentes técnicas de pesquisa, visando apreender uma determinada situação e descrever a complexidade de um fato”. A técnica utilizada para a coleta de dados foi realizada através de observação direta, entrevistas e conversas informais e registro fotográfico. Inicialmente trabalhamos com

18

um roteiro de entrevistas, contudo, percebemos uma necessidade dos atores envolvidos em contar como ocorria o fenômeno, e uma espécie de timidez ao perceber que a pesquisadora estava anotando as respostas. Esse motivo nos levou a optar pelo método de conversas informais, efetuadas para estimular os informantes a falar, onde algumas conversas puderam ser gravadas. Em especial as conversas com os moradores da ilha, pois logo nos primeiros contatos percebemos que os mesmos possuíam um conhecimento da situação que enfrentavam o que lhes proporcionou uma linguagem própria sobre as etapas do desastre. As atividades para a construção dessa pesquisa realizaram-se em duas etapas interligadas: o estudo bibliográfico e a construção do referencial teórico; e o trabalho de campo. A primeira etapa foi fortemente influenciada pelas bibliografias utilizadas nas disciplinas cursadas no mestrado, o que nos aproximou da temática socioambiental especialmente na Amazônia. Além da pesquisa bibliográfica, foram utilizadas outras fontes como o banco de dados e informações do Ministério de Integração Nacional e a Secretaria Nacional de Defesa Civil; além de imagens de satélite e reportagens de jornais locais. As imagens de satélite foram utilizadas para verificar a aludida diminuição do território da praia, tendo sido relacionadas e analisadas imagens em períodos distintos: no ano de 2007 e 2011. Este procedimento contou com o apoio do Professor Dr. Breno Imbiriba. Na segunda etapa, foi realizado o trabalho de campo que ocorreu em dois períodos: novembro de 2011 e junho de 2012. No período de 8 a 18 de novembro de 2011, ficamos na sede do município em uma pousada próxima ao porto, para facilitar o acesso à ilha. Para chegarmos à ilha fretamos uma embarcação, pois não há transporte público para o local. Nesse período realizamos a coleta de dados, através das entrevistas e de conversas informais com os atores sociais envolvidos. Na sede administrativa do município de Augusto Corrêa, estivemos na Prefeitura do Município, na Secretaria de Trabalho e Promoção Social (SEMTEPS) onde entrevistamos uma Assistente Social; na Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) onde entrevistamos o Secretário Municipal de Meio Ambiente; na Secretaria Municipal de Obras e Serviços Urbanos (SEMOB) estabelecemos contato com o diretor do departamento de obras, que nos auxiliou a encontrar o destino atual dos deslocados da ilha. Na segunda visita ao município foi realizada uma pequena entrevista com o atual Prefeito do município. Foi entrevistado também o atual presidente da Colônia dos Pescadores do município, Colônia Z – 18, o mesmo é o representante dos moradores da ilha da Coroa Comprida, pois foi morador da ilha durante muitos anos e elegeu-se vereador do município

19

por duas vezes, motivo esse que o aproximou do atual prefeito para viabilizar a retirada dos moradores da ilha em questão para um território mais seguro. Na ilha, entrevistamos cinco famílias, entre elas, a família da pessoa responsável pelo transporte de água potável para ilha (Imagem 1), uma vez a água dos poços existentes na ilha não é mais apropriada para o consumo da população. Dentre as famílias entrevistadas uma chamou nossa atenção: uma família onde todas as mulheres são pescadoras, inclusive a matriarca da família cuja idade ultrapassa sete décadas, que segundo relato dos moradores é a “melhor catadora de camarão” da ilha (Imagem 2). Em nosso primeiro contato com a população da ilha, percebemos um grande interesse dos moradores da ilha em falar sobre como se dá o fenômeno de erosão, que ocasiona a redução do território da praia e os expulsa de suas habitações. Foi quando optamos pelo método de conversas informais, o que nos proporcionou o compartilhamento do saber local, através dos relatos de como são percebidos e enfrentados os problemas em consequência dos recorrentes processos erosivos, dentre eles a diminuição da extensão territorial da praia. Para nossa pesquisa o fator relevante das conversas está na riqueza de detalhes que possuíam as respostas dos entrevistados sobre a situação de desastre. Durante o período de campo, pudemos registrar dois diferentes processos erosivos dentro do território da praia, um ainda cheio chamado por eles de “grota” e um mais antigo que se encontrava já com pouca água, que serviram para ilustrar como os processos erosivos são recorrentes nessa região. O trabalho está dividido em cinco capítulos: o primeiro capítulo é composto por esta introdução e os procedimentos metodológicos; no segundo capítulo apresenta-se a caracterização da área de estudo: o município de Augusto Corrêa e a Ilha da Coroa Comprida. O terceiro capítulo aborda a fundamentação teórica. O quarto capítulo narra a descrição do fenômeno do ponto de vista geofísico (imagens de satélite); a descrição do fenômeno a partir do ponto de vista dos moradores deslocados e a partir do ponto de vista do Poder Público. E o quinto capítulo aborda as soluções encontradas pelo Poder Público e pelos próprios moradores deslocados. Por fim, apresentamos algumas reflexões a guisa de conclusão.

20

Imagem 1 – Conversas informais com Moradores da ilha da Coroa Comprida

Fonte: Bentes (2011)

Imagem 2 – Conversas com família de pescadoras da ilha.

Fonte: Bentes (2011)

21

CAPÍTULO II - ILHA DA COROA COMPRIDA - AUGUSTO CORRÊA / PA 2.1 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO 2.1.1 Localização do Município de Augusto Corrêa

O município de Augusto Corrêa está localizado na região nordeste do Estado do Pará. Integra a mesorregião1 do nordeste paraense (Mapa 1) e da microrregião do Salgado, ocupando uma área de 1.217,70 km2. Está situado entre as coordenadas geográficas de 00°52’18” e 01°20’10” de latitude sul e 46°20’05’’ e 46°40’01 de longitude oeste de Greenwich. Seus limites são: ao norte o Oceano Atlântico, a leste o município de Viseu, a oeste o município de Bragança; e ao sul os municípios de Bragança e Viseu (SANTOS ET AL, 1999). Segundo IBGE (2012), o município possui origens que datam de 1895, ainda como povoado de Bragança, sendo denominado Umarajó. Em 1898, foi elevado à categoria de vila, baseado na lei n° 567, de 7 de julho. Houve a primeira tentativa de tornar-se município de Umarajó em 1955, por meio da lei n°1.127 de 11 de março, que foi considerada inconstitucional. O desmembramento de Bragança só pode ser alcançado em 1961, outorgado pela Lei Estadual n°2.460, de 29 de dezembro. De acordo com os dados do Zoneamento Agroecológico, o município conta com uma cobertura vegetal diversificada que inclui: floresta equatorial subperenifólia (garantia a cobertura da maior parte da região, atualmente, apresenta-se com constituição florística); floresta hidrófila e higrófila de várzea (conhecidas como "mata de várzea", ocupam faixa considerável. Caracterizam-se por ficarem permanente e temporariamente inundadas, com poucas espécies, porém, sem interferência de água salina, e compõem-se de espécies florestais de porte mediano e ocorrências de alguns indivíduos de menor porte); formações de praias e dunas (a vegetação é uniforme e cresce nas areias brancas, caracterizada pelo ajuru alecrimda-praia e salsa-da-praia); campos equatoriais higrófilos de várzeas (apresenta uma fisionomia campestre uniforme, caracterizada por solo com problemas de hidromorfismo, onde o alagamento periódico seleciona as espécies ecologicamente adaptadas, tais como: aturiá, 1

Municípios integrantes da mesorregião do nordeste paraense Abaetetuba, Acará, Augusto Corrêa, Aurora do Pará, Baião, Bonito, Bragança, Cachoeira do Piriá, Cametá, Capanema, Capitão Poço, Colares, Concórdia do Pará, Curuçá, Garrafão do Norte, Igarapéaçu, Igarapé-Miri, Ipixuna do Pará, Irituia, Limoeiro do Ajuru, Mãe do Rio Magalhães Barata, Maracanã, Marapanim, Mocajuba, Moju, Nova Esperança do Piriá, Nova Timboteua, Oeiras do Pará, Ourém, Peixe-Boi, Primavera, Quatipuru, Salinópolis, Santa Luzia do Pará, Santa Maria do Pará, Santarém Novo, São Caetano de Odivelas, São Domingos do Capim, São Francisco do Pará, São João da Ponta, São João de Pirabas, São Miguel do Guamá, Tailândia, Terra Alta, Tomé-Açu, Tracuateua, Vigia, Viseu.

22

canarana, capim-de-marreca, junco e piri; e a formação manguezal (com grande poder de regeneração, se encontra em ambiente salino e salobre, acompanhando os cursos dos rios, abrigando-se nas áreas que sofrem influências das marés, cuja designação, é "apicum") (SANTOS ET AL, 1999 p.9, 10).

Augusto Corrêa é integrante da composição da zona costeira2 paraense. A gestão da zona costeira Brasileira é definida pela Lei n°. 7661 de maio de 1988, que estabelece o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC). A referida lei em seu Art. 2º aponta a utilidade do PNGC: “o PNGC visará especificamente a orientar a utilização nacional dos recursos na Zona Costeira, de forma a contribuir para elevar a qualidade da vida de sua população, e a proteção do seu patrimônio natural, histórico, étnico e cultural.” (Presidência da Republica do Brasil, 2004). Conforme Szlafsztein (2009, p.48) zona costeira é determinada como: “o espaço geográfico de interação do ar, do mar, e da terra, incluindo seus recursos (renováveis ou não).” O autor ainda menciona que os municípios costeiros são os defrontes ao Oceano Atlântico ou não, “mas que contemplem em seu território ecossistemas costeiros de alta relevância e/ ou atividades ou infraestruturas de grande impacto ambiental na zona costeira”. O município preserva como principais ecossistemas: os ambientes estuarinos formados pelos rios Urumajó, Caeté, Aturiaí, Emboraí entre outros; é também caracterizado com a presença de arquipélagos, onde encontramos importantes ilhas, tais como: Coroa Comprida, Ponta do Cardoso, Ponta do Rodrigo, Camará - Açu ou do Meio e da Coroa Seca, todas as ilhas são marcadas por manguezais (ROSA, 2007). Vale ressaltar que aos manguezais são importantíssimos para existência de comunidades que habitam beira-mar, pois os mesmos vivem dos recursos naturais extraídos da pesca e da coleta de mariscos. Nesse sentido, Alier (2007, p. 120) diz: “Os mangues são habitados por uma população pobre que vive de modo sustentável em meio essa vegetação ou próxima a ela, coletando, consumindo e vendendo caranguejos e conchas, além de pescar, empregando a madeira dos mangues para produzir carvão e consumi-la como material de construção. Os mangues são geralmente terras públicas por estarem localizadas nas zonas de marés.

2

O PNGC II assim define zona costeira: “abriga um mosaico de ecossistemas de alta relevância ambiental, cuja diversidade é marcada pela transição de ambientes terrestres e marinhos, com interações que lhe conferem um caráter de fragilidade e que requerem, por isso, atenção especial do poder público, conforme demonstra sua inserção na Constituição Brasileira como área de patrimônio nacional”. O documento em seu anexo “B” inclui Augusto Corrêa na relação dos municípios abrangidos pela faixa terrestre da zona costeira.

23

Mapa 1 - Mesorregião do Nordeste Paraense

Fonte: Banco IBGE (2012)

24

O município possui em seu território duas Áreas Protegidas: APA da Costa de Urumajó e Resex Marinha de Araí-Peroba, que foram instituídas por lei para preservação e conservação ambiental dos respectivos espaços. Conforme Rosa (2007), o município é composto pelos distritos de Augusto Corrêa (sede), Aturiaí, Emboraí e Itapixuna. Além destes possui algumas vilas pesqueiras (Mapa 2). As principais vilas pesqueiras são: Araí, Aturiaí, Nova Olinda, Perimirim, Ponta do Umarajó, Porto do Campo e Coroa Comprida que é nossa área de estudo, e que podemos perceber com a visualização do mapa abaixo, não esta incluída na delimitação das Áreas Protegidas do município. Mapa 2 – Vilas pesqueiras de Augusto Corrêa na área de influência da APA da costa de Umarajó.

Fonte: Rosa (2007)

25

2.2 ASPECTOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E AMBIENTAIS DO MUNICÍPIO.

Dados do censo de 2010 apontam que a população do município somava 40.497 habitantes, divididos entre a zona rural e urbana: 22.257 e 18.240 respectivamente. De acordo com Santo (2011), como a população do município é acima de 20 mil habitantes, o mesmo encontra-se obrigado a elaborar seu Plano Diretor Municipal, que para a região é de grande importância desde que a temática sobre risco natural esteja inserida, uma vez que o mesmo faz parte da zona costeira paraense. De acordo com Santos et al. (1999), a drenagem da região é feita através das baías que delineiam a região: Caeté, Emboraí, Chuna e Camará Açu, e através dos rios, que entre eles podemos destacar o rio que banha a sede administrativa do município: o Urumajó (Imagem 3). Ao permanecermos no município constatamos que os rios tem extrema importância na vida da população local, e diferente ao nosso o tempo, o tempo deles é determinado pelo processo de maré alta e maré baixa.

Imagem 3 – Porto banhado pelo rio Urumajó

Fonte: Bentes (2011)

Em nossas visitas, pudemos comprovar que a cidade é impulsionada através da atividade pesqueira, oriunda de sua localização litorânea. Conforme dados da Secretaria Executiva de Estado de Planejamento, Orçamento e Finanças – SEPOF (2011), a principal atividade econômica do município é a pesca, seguida de diversas outras atividades secundárias como a agricultura, e o extrativismo vegetal; sendo o setor primário a principal fonte geradora de renda ao município.

26

O setor pesqueiro designado como o de maior importância para o desenvolvimento do município demanda, dentre outros estabelecimentos, as fábricas de gelo que se encontram espalhadas pelo município: uma na sede do município; outra na Ilha das Pedras, e a outra em Nova Olinda (ROSA, 2007, p.41). O setor conta com 29 associações agropesqueiras formais, 02 associações informais e uma Colônia de Pescadores, a Z – 18. De acordo com Rosa (2007), a prática da pesca no município, é desenvolvida por diversos tipos, dentre eles: coleta manual, armadilhas móveis e fixas, redes móveis e fixas e linhas. Existem vários tipos de peixes e crustáceos que podem ser encontrados na área de influência de pesca do município como, por exemplo, cavala, peixe serra, pescada amarela, camarão, lagosta dentre outros (Mapa 3). Mapa 3 - Artes de Pesca de Augusto Corrêa

Fonte: HABTEC/OGX (2009).

27

2.3 LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA ILHA DA COROA COMPRIDA A problemática aqui abordada guarda estreita correlação com a localização geográfica. A ilha da Coroa Comprida compõe o contexto hidrográfico do município de Augusto Corrêa. A sua hidrografia é delineada pelo Oceano Atlântico e pela Baía do Caeté. O acesso à ilha é feito única e exclusivamente por meio fluvial. A mesma é localizada à cerca de duas horas de barco do porto da sede do município. A ilha apresenta os seguintes ecossistemas: praias, dunas, manguezal, restingas e campos salinos, situados à margem do Oceano Atlântico. A mesma apresenta em sua extensão territorial os solos salino e areias quartzosas marinhas, com relevo plano nas áreas de praia e ondulado nas áreas de dunas. A textura é muito argilosa na região designada com Zona de Preservação Influenciada por Inundação e Salinidade, já na Zona de Preservação representada por dunas e Praias à textura é sempre areia, nessa área os problemas encontrados são: a escassez de nutrientes, e a drenagem elevada. (SANTOS et al.; 1999, p.43). Conforme dados do Zoneamento Agroecológico do município, a ilha da Coroa Comprida é identificada como Zona de Preservação Influenciada por Inundação e Salinidade, que corresponde à seguinte caracterização: Compreende ecossistema frágil composto por vegetação com influência fluviomarinha. Apresenta fortes limitações por excesso de água e altos teores de salinidade, correspondendo às áreas com solos salinos sob vegetação de manguezal. Recomendada para a preservação da flora e da fauna e recreação, não só por se tratar de áreas protegidas por lei mas, também por serem berçário e áreas de reprodução de peixes, crustáceos e moluscos (SANTOS et al.; 1999, p.45).

Parte da área da ilha foi identificada como Zona de Preservação Representada por Dunas e Praias: Compreende ecossistema formados por praias e duna e que recebem influência direta do Oceano Atlântico; são áreas que sofrem inundações frequentes e apresentam altos teores de salinidade e solos areno-quartzosos. Recomendado para recreação e turismo. (SANTOS et al.; 1999, p.45).

Conforme dito anteriormente, o único meio de acesso a ilha é feito por meio de embarcações, por esse motivo ao chegarmos ao município de Augusto Corrêa pudemos contar com o auxilio do motorista de ônibus intermunicipal (que faz o percurso de Belém até o município), que no apresentou o atual presidente da Colônia dos Pescadores - Z – 18. O

28

presidente da Colônia nos fretou uma embarcação que foi guiada por um mestre e dois barqueiros. O mestre do barco foi nosso terceiro entrevistado e nosso guia na ilha, pois o mesmo nasceu na ilha e morou durante vários anos de sua vida. Chegando a ilha constatamos logo que a população que ainda reside no local, depende única e exclusivamente da pesca de peixes, crustáceos e moluscos. Com exceção de três servidores públicos: o professor e a servente da escola, e uma enfermeira. O que pode ser confirmado com o que diz Pinheiro (2010) a comunidade é constituída basicamente de pescadores, que tem na pesca o seu principal meio de sobrevivência (Imagem 4). Observa-se, assim, uma estreita correlação entre: o meio ambiente através de seus recursos naturais e o modo de vida da população local. Esse contexto completa-se com o que diz Bastos (1995, p.42) “O litoral, que é integrado por ecossistemas de manguezais e restingas, é naturalmente rico em recursos alimentares, sendo por este motivo atrativo as populações humanas, que o ocupam desde a pré-história”. Por esta razão, os rios tem relevante importância na vida dessas populações, e os auxiliam na composição de sua identidade e relações sociais. Existe considerável relação entre as populações da Amazônia seus rios, lagos e mares. A zona costeira dessa região atrai diversas atividades econômicas e sociais, dentre essas a exploração mineral, o comercio de peixes e mariscos, e o turismo. Para Pires et al (2012, p.277) “Os usos das zonas costeiras, que são atractivas para uma vasta gama de actividades humanas, têm contribuído para uma maior exposição ao risco de erosão e galgamento oceânico.” Na ilha da Coroa Comprida, percebemos a pesca como única atividade econômica explorada pelos nativos. O turismo, segundo os relatos foi abandonado devido à exposição e ameaças aos riscos decorrentes do desastre ambiental. Para esboçar a importância da pesca para os nativos da ilha, podemos exibir um trecho de uma conversa 3 tida com seu José o mestre da embarcação que nos levou até a ilha, o mesmo também é pescador, nasceu e se criou na vila pesqueira, e conhece todos os moradores da ilha: A nossa pescaria, é o ramo que nós trabalhamos aqui, eu passo dez dias no mar, de dez a quinze dias, tem viagem que eu ganho até mil reais, tem viagem que é quinhentos, seiscentos e tem viagem que não dá nada, né. E esse povo que vive aqui, vive só de pesca. Vive só de pesca e a pescaria daqui de dentro da ilha é mais de mulher, pesca homem e mulher. Chega de noite aí cada uma pega uma puçá e sai. Tem uma senhora ai que vou te levar pra conhecer é a Dona Joana, pescadora, tá com 76 anos, ela pesca, é aposentada e num que ir pra Augusto Corrêa ela diz que só vai daqui quando morrer (novembro de 2011).

3

Os nomes utilizados nesse trabalho são fictícios para preservar a identidade dos entrevistados.

29

Imagem 4 - Características da Ilha da Coroa Comprida.

Fonte: Jornal Diário do Pará (2010).

Durante a pesquisa de campo, observamos que a ilha é caracterizada pelos moradores como seu espaço de moradia e trabalho, e é através da pesca que os mesmos constituem sua cultura e identidade. Para essa população a pesca é tão importante que chega a ser motivo de orgulho, o que pode ser confirmado com o trecho da conversa com seu João: “Eu sou pescador orgulhoso, eu, pra mim num tem outro ramo que seja melhor do que a pesca”. Perguntamos para o entrevistado sobre as mulheres: - As mulheres daqui são pescadoras? – Todas as mulheres daqui são pescadoras. Quando os homens saem para pescar em alto mar, as mulheres além de cuidarem dos afazeres domésticos, providenciam a alimentação diária da família com a pesca de camarão, caranguejo e siri. Dessa forma, nos remetemos ao modo de vida das populações tradicionais e consideramos o que diz Moraes (2007), populações tradicionais tem como peculiaridade a utilização de tecnologias simples na busca dos recursos naturais necessários a sua subsistência. A população da ilha possui estreita relação com os ecossistemas ali presentes, sobretudo quando se trata de sua atividade produtiva. Os mesmos demonstraram também que além de interagirem com os ecossistemas, consideram-se como integrantes do meio ambiente. Daí o sentido de pertencimento ao seu local de vivencia, ou seja, a ilha. A vivencia nesse território os proporciona suas fontes de trabalhos e a formação de suas redes sociais através do

30

contato com a vizinhança ali presente. Assim, mencionamos o que diz Bourdieu (2004, p.158), “o habitus é ao mesmo tempo um sistema de esquemas de produção de práticas e um sistema de esquemas de percepção e apreciação das práticas. E, nos dois casos, suas operações exprimem a posição social em que foi construído”. Por esse motivo, durante anos relutaram em deixar a ilha e aceitaram conviver com a mobilidade das suas moradias. Segundo relato local, cada vez que a “maré esbandalhava” suas casas eles construíam outras casas em outro local “aparentemente mais seguro”, contudo ainda dentro do território da ilha com a intenção de permanecerem morando no local. De acordo com Rosa (2007), cerca de 200 pessoas já habitaram nesta ilha. Dessas, quarenta atuavam na pesca de curral4. Devido à erosão, parte dessa comunidade se deslocou para outra vila da região conhecida como vila de Perimirim. Segundo os relatos dos próprios moradores, a ilha já comportou em torno de 400 famílias ou mais; a vila possuía uma grande área que era ocupada por três ou mais ruas com grande número de casas e de coqueiros, conforme podemos observar no trecho a segui: “A primeira vez que esbandalhou chega dava era pena, eram três ruas aqui, três ruas. Coqueiro, coqueiro queria que tu visses o tanto de coqueiro, que nos andávamos por debaixo do coqueiro. Na época que eu falo tinha 300 famílias ou mais.” (Seu João, novembro de 2011). A fala de seu José é complementada com a de dona Maria “Tinha por que aqui tinha quatro linhas de poste, eram quatro ruas”. Seu João continua: “o motor era um 61, o motor atual é 16, um motor pequeno é novinho que o prefeito mandou não tá com 15 dias, o velho esbandalhou e ele pra num consertar o velho mandou comprar um novo. É bom que o prefeito nunca nos abandonou, se fosse outro que nem ligasse...”. Seu João referia-se a potencia do motor, há alguns anos atrás quando havia mais moradores na ilha, era necessário um motor mais potente, para suprir a necessidade de geração de energia, agora que são poucos moradores um motor de menor potencia já satisfaz as necessidades dos moradores. Atualmente, vivem na Ilha aproximadamente 15 famílias, que insistem em permanecer no local. Alguns alegavam não querer deixar o local por se tratar de seu local de origem e seu habitat, outros por não possuírem condições financeiras para se deslocar. A outra parte da população teve que se deslocar devido às sérias consequências da erosão fluvial. As

4

Segundo Rosa (2007, p.47) “A pesca de curral é a mais frequente, tendo como espécies mais capturadas a tainha, pratiqueira, urutinga, corvina, bagre e cangatã”.

31

poucas famílias que permanecem no local (Imagem 5), são justamente as que dependem de soluções do poder público (BENTES, MAGALHÃES, 2012). Seguramente podemos afirmar que os moradores que ainda permanecem na ilha, são pescadores e que vivem exclusivamente da pesca como atividade econômica e de subsistência, por esse motivo é que relutam em deixar o local. Os mesmos não possuem recursos financeiros suficientes para alugar uma casa ou comprar um terreno, e nem podem contar com o auxilio de amigos ou parentes, por esse motivo aguardam a solução encontrada pelo governo de remoção das ultimas famílias que ainda permanecem na ilha. Como comprovamos na fala de Dona Maria: é senhora moro uns 30 anos. ainda estamos aqui por conta de uma proposta de uma casa que fizeram. já mudamos muito! já viemos de lá. já mudamos pra cá ai a maré escangalho, lá nos viemos pra cá. moramos uns 20 anos lá, ai a maré esbandalho, e nós viemos pra cá. (Dona Maria, novembro de 2011).

Na ilha havia algumas casas e/ou ranchos, que são habitações locais feitas de madeira com aspecto de abandonadas e/ou destruídas. Visualmente percebemos que as mesmas eram construídas com materiais já utilizados para construções anteriores e que podemos confirmar com o seguinte relato de uma moradora: “a gente constrói nossas casas com restos das casas destruídas pela maré”. Imagem 5 - Casas remanescente na ilha

Fonte: Bentes (2011)

As casas são reconstruídas por eles, para que possam permanecer abrigados na ilha. Os que ainda habitam na ilha chamam as construções de casas e os que já se deslocaram chamam as habitações de “ranchos”.

32

Os ranchos são utilizados somente no período de pesca e muitas vezes, já foram suas antigas casas. Tivemos oportunidade de fazer o registro fotográfico de um rancho utilizado no período de pesca (Imagem 6), o que confirmamos com o relato de um moradora “essa família já mudou daqui, eles usam esse rancho quando tá no período da maré é quando eles vem pescar, depois da pesca eles descansam aqui e em seguida vão embora pra casa deles lá na cidade”. (Rosa, novembro de 2011). Olhando a foto podemos perceber que o rancho é suspenso ao chão, para que se a maré chegar até ali não alcance o piso da casa. Rosa ainda fala da situação que estão enfrentando e da sua preocupação com a chegada do inverno: “Agente fica preocupado de sair daqui por causa do inverno, no inverno é que é ruim aqui. As águas são muito grandes. Agora é verão a água vem aqui, bem por aqui assim, molha tudo, passa por aqui de baixo da minha casa”. Imagem 6 - Rancho na Ilha da Coroa Comprida

Fonte: Bentes (2011)

O modo de vida dessa comunidade é familiarizado com os recursos naturais disponíveis nos ecossistemas da região litorânea, que mantém a sobrevivência e o sustento da população local. Dentre os diversos recursos disponíveis aproveitados pelos nativos na ilha podemos citar os recursos advindos do mar e do mangue. O que é confirmado por Bastos (1995, p. 45) “Um dos ecossistemas litorâneos de suma importância para as comunidades pesqueiras é o manguezal. É um criadouro natural e abrigo de diversas espécies de peixes, camarões, caranguejos, teredos (denominados de turus na região) e outros”. E esse contato com a natureza e os recursos disponíveis nela agregou aos moradores da ilha conhecimentos e experiências sobre seu território e a situação de desastre ocorrido na ilha. Nesse sentido, o território, antecede a esse contexto que esta sendo vivido

33

atualmente pelos deslocados da ilha. A abordagem utilizada atualmente sobre o contexto de território é tão abrangente que agrega ao seu conceito o sentimento de pertencimento que torna o homem não somente seu habitante mais sim, parte integrante desse território. Podemos notar a expansão do termo território em um trecho que diz Raiol (2010, p.68): “Deve-se, nessa perspectiva, delimitar uma concepção de território que de conta da pluralidade de atores que interagem no meio físico e que permita a identificação de suas múltiplas relações, de seus saberes, de suas expectativas e finalmente, progrida para um reconhecimento de território como um valor, como algo associado à dignidade do próprio homem, passível ate mesmo, quem sabe de caráter antológico.”

Nesse sentido, o conceito de território é amplo e diverso, há uma polissemia de conceitos usados para a definição de território, estamos falando também de varias maneiras de interpretação. Assim, assumindo as palavras de Haesbaert (2005), o território precisa ser percebido numa perspectiva mais integradora como o espaço indispensável para a reprodução social, seja de um indivíduo (sua experiência integradora do espaço), ou de um grupo ou até mesmo de uma instituição. Sendo assim, apresentamos o que diz Valencio et al. (2009, p.52) “Todo território é construído a partir das disputas de poder entre os agentes, isto é, um território não é dado, não tem sentido em si mesmo, mas somente a partir do uso que se faz dele.” Os autores mencionam “A casa é assim um território que permite a construção da realidade social da família.” No contexto da ilha, não somente a casa e/ou rancho possui diversos significados com o de abrigo, intimidade, segurança e pertencimento, igualmente o território da ilha e seus ecossistemas. Dessa forma, passamos ao conceito de territorialidade que segundo Raiol (2010) sob uma perspectiva abrangente a territorialidade está atrelada fundamentalmente a cultura, o que afiança a apropriação e a permanência no território. A territorialidade, por um lado, produz, constrói o território, fazendo com que as pessoas que ocupam esse espaço dele se apropriem, passando a manter sentimentos de pertencimento ao lugar, estabelecendo-se laços de ligação da população, uns com os outros membros, com as suas praticas, suas historias, suas memórias, enfim, criando aquilo que se denomina de ‘consciência de confraternização’. (Raiol 2010, P.78)

Valencio et al (2009, p.52) menciona que o território “pode ser desfeito, pode ser negada a fixação do grupo social a uma base biofísica ou física, sendo este grupo, portanto, desterritorializado.” Os moradores que já saíram da ilha estão passando um processo de

34

desterritorialização, perdendo seu referencial de vida e sua memória cultural e ao mesmo tempo estão enfrentando um processo de reterritorialização. Apesar disso, essa discussão vai muito além e apresenta diferentes interpretações. Assumiremos o raciocínio de Haesbaert que através da leitura das ideias de Gilles Deleuze e Félix Gattari, conceitua simplificadamente desterritorialização como sendo compreendida como um movimento que separa o indivíduo de suas ascendências tanto sociais quanto culturais e pode ser demonstrado a partir da saída ou abandono do território, já o processo de reterritorialização pode ser interpretado como a etapa ou o processo de construção de um território. (HAESBAERT, 2009) Assim reinteramos, que a população da ilha em questão, enfrenta dentre outros um processo de desterritorialização ocasionada pelo fenômeno de erosão. Esse processo pode ser agravado, por exemplo, pelas chuvas, sob essa perspectiva Valencio et al. (2009, p.52-53) “Quando as chuvas precipitam sobre uma determinada configuração territorial, a ocorrência de um desastre depende da interação entre o fenômeno natural e a vulnerabilidade produzida socialmente, de modo que esta relação implique danos e prejuízos.” Para os autores podemos citar a erosão como um dano ambiental, e a destruição das casas como danos materiais, já os danos humanos relaciona as pessoas feridas, desabrigadas ou desalojadas. Todavia, o contexto fica explicito na seguinte passagem do texto “Se casas forem destruídas ou danificadas, haverá a desterritorialização de famílias por parte dos órgãos públicos, e estas serão denominadas como desalojadas5 ou desabrigadas.” (VALENCIO et al. ,2009, p. 53) Sob essa perspectiva, é preciso resaltar que riscos de acidentes e catástrofes tem sido ameaças constantes para a humanidade independente de território e classe social. Contudo, as medidas de proteção tomadas são divergentes de acordo com o contexto vivido, podemos citar o que diz Valencio et al (2009, p.7) a respeito de conversas informais no leito da defesa civil: “se ouve discursos no qual o estresse dos estabelecidos, cujos meios materiais sofreram danificação ou destruição em desastre, deva ser objeto de amparo psicossocial ao passo que o dos empobrecidos não causa preocupação.” Podemos citar ainda o que dizem os 5

Desalojados conforme Castro (1999, p. 23) “Pessoas cujas habitações foram danificadas ou destruídas, mas, que não necessariamente precisam de abrigos temporários.” Ou seja, são pessoas que compulsoriamente precisam deixar suas habitações devido a medidas de preventivas de evacuação, ocasionada por danos ao imóvel ou destruição. As mesmas dispensam as providências de abrigo a serem tomadas pelo Estado, pois utilizam benefícios de suas redes sociais, abrigando-se em casas de parentes ou amigos. VALENCIO et al. (2009) Desabrigados segundo Castro (1999, p. 23) “São cujas habitações foram destruídas ou danificadas por desastres, ou estao localizadas em áreas de risco iminente de destruição, e que necessitam de abrigos temporários para serem alojadas”. Essas pessoas não podem contar com o apoio de redes sociais, dependendo exclusivamente de medidas do Estado para se abrigar.

35

autores “a representação do mundo social que agentes de defesa civil por vezes mantém, com base em preconceito de classe, é de que o sofrimento recorrente cria calos emocionais aos empobrecidos; já os afluentes tem sensibilidades que merecem cuidados." Diante ao cenário exposto, evidenciamos o abandono da população que ainda habita a ilha, uma vez que, não estão sendo garantidos seus direitos individuais como os direitos relacionados à saúde. Confirmamos a existência de um envelhecido Posto De Saúde (Imagem 7) que não encontra-se em funcionamento, não mantendo a prestação de serviços médicos. Atualmente o posto serve para abrigar duas famílias que tiveram suas casas destruídas pela maré, o que pode ser confirmado através do relato de dona Maria. “Aqui tinha posto médico. Era bem organizado, no posto não funciona mais nada, não tem nenhum médico. Não tem quem queira vir, mais pra cá [...] Tem uns que tão contando com a casa que o prefeito mandou fazer, né, faz dois anos que o pessoal da Defesa Civil veio aqui, quando eles vieram foi mês de março a maré tava esbandalhando a praia e tinham duas famílias morando no posto de saúde que a maré derrubou a casa deles e eles ficaram desabrigados, ligaram pro prefeito e o mesmo disse pra eles irem se abrigar no posto. [...] Aí no posto não tem nada. Se ficar doente é só pela graça de Deus mesmo: se fica bom, se num fica bom. Num tem quem faça curativo, num tem nada”. (Dona Maria, novembro de 2011).

Imagem 7 - Posto de Saúde da Ilha da Coroa Comprida.

Fonte: Bentes (2011).

Confirmamos ainda a existência de uma escola que permanece em funcionamento para atendimento a educação de 11 alunos, que são regularmente matriculados. Os alunos são integrantes de seis famílias moradoras da ilha (Imagem 8). O professor da escola nos permitiu

36

nossa entrada nas instalações da escola, que visivelmente é uma das melhores instalações na ilha, possuindo salas de aula, banheiro e água potável para suprir a necessidade dos alunos.

Imagem 8 - Escola Municipal da Ilha da Coroa Comprida.

Fonte: Pinheiro (2011).

O professor é um dos moradores da ilha. Segundo os relatos dos moradores tem sido difícil contratar e manter os servidores para trabalhar nas instituições existentes na ilha, em função das ameaças de risco de desastre e de o único meio de transporte ser através do rio. Assim como é complexo manter por um longo período de tempo, as edificações públicas no mesmo lugar. O que pode ser corroborado na seguinte passagem do texto: Foi quando Inaugurou o primeiro colégio aqui. Fez um colégio grande, inauguraram numa semana quando foi na outra semana das águas de setembro, de outubro deu uma cheia com ventos do norte daqui. Que agente olhava e fazia pena ver casa cair. Caia casa, coqueiro, caia por cima de casa, o jeito era agente abandonar, só tirava de maré seca, depois que a maré chegava ai ninguém num tirava agente andava de casco dentro da praia, remando dentro de casco, ai caia 50 casa 60 casa. Agente ia tirando e ia mudando, ainda bem que o pessoal era tudo unido, agente se juntava e se ajudava, um ia numa casa quando tava pra cair na beira, mais essa acabou também quando vinha com ribanceira mesmo, quando ela é só aquela que ela passa por dentro assim. Nós fazíamos ribanceira da altura do poço, pra nos arranjar água pra nos bebermos. (Seu José, novembro de 2011).

Com as conversas informais nos tornamos mais próximos dessas pessoas, o que nos permitiu ouvir as narrações de episódios da vida deles em anos anteriores, como esse relato citado anteriormente que foi contado por seu José. O mesmo não soube estimar a data

37

desse episódio, contudo analisando as imagens de satélites podemos comprovar que há uma mobilidade das casas e edificações existentes na ilha. Na ilha ainda existe uma igreja (Imagem 9) que não exerce mais sua função social, pois também já foi abandonada. Imagem 9 - Igreja abandonada

Fonte: Pinheiro (2011).

Entre uma conversa e outra, descobríamos que vários dos moradores nasceram na ilha, e esse entre outros motivos é o que faz com que os moradores não queiram deixar o território. Como podemos citar alguns trechos das conversas, dona Maria diz: “Eu nasci e me criei aqui na ilha, tenho 46 anos”, seu marido completa: “Moro aqui há 30 anos, vim do Maranhão, tivemos cinco filhos morando aqui, agora eles foram embora pra estudar em Augusto Corrêa, e vem passar o final de semana”. Outro entrevistado confirma que nasceu na ilha: “Nasci e me criei na Coroa Comprida tenho 46 anos, e não gostaria de deixar de morar lá, só saí por causa do efeito das marés, que esbandalhou os barracos.” (Seu Manoel, junho de 2012). Uma das moradoras mais antigas na ilha, diz que não nasceu na ilha, mas confirma que seus filhos nasceram: “Ah! Eu moro aqui a uns quarenta e dois anos, essa é minha filha nasceu aqui, meus filhos mesmos todos são dez e estão todos vivos.” (Dona Joana, agosto de 2011). Atualmente os moradores que permanecem na ilha aguardam a finalização da construção de vinte cinco casas, destinadas às pessoas que não conseguiram se deslocar com seus recursos próprios. Entre eles a dona Joana: “To esperando uma casa que ta saindo pra lá

38

(Augusto Corrêa). Eu to por aqui que eu gosto de ta aqui na praia, porque eu gosto de ta pescando, pegando camarão”. Uma das pessoas que nos auxiliou nessa pesquisa foi o atual presidente da Colônia dos Pescadores – a Colônia Z – 18. Muito solicito, o mesmo em nossa primeira visita ao município, nos concedeu entrevista e momentos de longas conversas informais. O mesmo nos levou até sua residência e nos apresentando a toda sua família. O que para o ele e para nós tinha importante significância, uma vez que ele e toda sua família são deslocados da ilha. Apesar de já morar na sede do município de Augusto Corrêa, o presidente da Colônia dos pescadores sempre visita à ilha, e se preocupa com a população que ainda não se deslocou da comunidade. O mesmo teve a oportunidade de se eleger por dois mandatos como vereador no município, em seus relatos, nos contou que já moraram mais de quatrocentas famílias na colônia de pescadores, e que já teve na ilha da Coroa comprida até uma seção eleitoral. Entramos em contato, com o Tribunal Eleitoral do município para obter informações sobre o número de eleitores que votavam nessa época na ilha. Contudo, não obtivemos resposta alguma até o momento. Seu Daniel nos revela que o número de moradores era bastante significativo: “Lá tinha 250 famílias, eu morei lá quarenta anos, cansei de conferir 400 casas”. O mesmo nos confirma que só deixaram a ilha em função do fenômeno natural, pois quando chove e chega o período de maré alta as casas são derrubadas, “esbandalhadas pela maré”. Com auxílio de seu Daniel fomos visitar um bairro chamado “Bom Jesus”, para onde se deslocaram alguns moradores da ilha. Segundo seu Daniel eles mudaram há aproximadamente uns três anos atrás, por conta própria, e foram construindo suas casas com recursos próprios, sendo que somente alguns ganharam uma “ajuda” da prefeitura para a construção de suas casas. O que podemos observar na fala de seu Daniel. “A ilha não esbandalha de uma vez, esbandalha pouco a pouco, cada ano esbandalha um pedaço. E agora não tem mais jeito. Eles vieram pra cá sozinhos, não tiveram ajuda da prefeitura não. Tiveram ajuda de Deus. Eles mudaram há três anos pra cá pra esse bairro” (Seu Daniel, presidente da Colônia de Pescadores, novembro de 2011).

Seu Daniel completa o discurso dizendo que alguns receberam tijolos, telhas e cimento. “Alguns receberam 2.000 tijolos, 10 sacos de cimento. Uns e outros foram beneficiados, não todos. O prefeito também ajuda, é um bom prefeito.” Podemos ouvir essa mesma frase de outros envolvidos na situação. Em nossa primeira visita ao local da pesquisa

39

ouvimos de vários moradores dizendo “que o prefeito os ajudava, e não havia os abandonado.” O que não ocorreu no segundo momento. Seu Daniel nos contou sobre o único projeto existente para amparo dos moradores em questão: a construção de vinte e cinco casas para os moradores que ainda permaneciam na ilha: “Quando eu fui com a Defesa Civil lá o levantamento que eu fiz foi pra 35 casas. Ai eles voltaram sozinhos até a ilha para refazer. As assistentes sociais do SIMTEPS foram lá e determinaram que fossem feitas somente 25 casas. O projeto é do governo com a COHAB e é demorado [...] o projeto da casa diz que a casa tem trinta metros quadrados, e cada uma custou oito mil e quinhentos reais”. (Seu Daniel, novembro de 2011).

Perguntamos para seu Daniel se havia a existência de outros projetos para atendimento dessa comunidade: Seu Daniel tem algum outro auxilio que a prefeitura fornece a esses moradores? Tem alguma ONG ou organização que ajude essas pessoas que se deslocaram da ilha? E obtivemos a seguinte resposta: Não, não. Não tem. O único projeto que é através da prefeitura é o projeto das casas feito pelo governo e pela COHAH, mais a COHAB é muito demorada. E o outro é a ajuda do governo federal que é a bolsa escola, pra quem estuda. É o que eles têm. Agora eu arrumei na CONAB duzentas cestas básicas. Consigo duas vezes no ano.

Indagamos ao mesmo qual era a atividade econômica exercida pelos moradores da ilha da Coroa Comprida e as pessoas já deslocadas? O mesmo respondeu: “Eles vivem da pesca.” Indagamos se existe algum projeto de qualificação e de inserção dessas pessoas no mercado de trabalho da região? E seu Daniel disse não haver outro projeto: “não há outro projeto, só o das casas mesmo”. Na segunda vez que estivemos no município, seu Daniel nos levou até a casa do atual Prefeito, que nos recebeu durante um curto período de tempo, ali mesmo no jardim de sua casa, entre as pessoas ali presentes, que também gostariam de conversar com o prefeito. O atual prefeito possui conhecimento sobre a situação enfrentada na ilha da Coroa Comprida, nos relatou “que há anos ocorre esse fenômeno natural na Coroa Comprida” e que “os moradores não deveriam estar nessa área pelo eminente risco vivido pelos mesmos”. O mesmo nos disse ainda que “esse fenômeno da natureza ocorre há anos na região e não é só lá, ocorre em Perimirim também, inclusive conseguimos recurso para a construção de um muro de arrimo, que também esta sendo derrubado pela maré”.

40

De acordo com o prefeito, “a prefeitura entrou com todas as medidas cabíveis para amparo dos moradores de Coroa Comprida e solicitou também recursos do governo federal para a construção de mais alguns metros de muro de arrimo” para a proteção do território de Perimirim.

O prefeito nos encaminhou para o Secretario de Finanças da prefeitura e para

uma professora da região, pois segundo ele “essas pessoas poderiam nos dar mais informações sobre as medidas tomadas pelo poder público para o amparo dessas vitimas”. Contudo, apesar de nossas idas a prefeitura, munidos de oficio da instituição de ensino, e com o estabelecimento de comunicação via internet (através de emails encaminhados ao Secretario de Finanças da prefeitura) não obtivemos qualquer resposta até o momento.

41

CAPÍTULO III – FENÔMENO NATURAL/ DESASTRE AMBIENTAL

3.1 QUANDO O FENÔMENO NATURAL SE TRANSFORMA EM DESASTRE

No mundo todo, diversas categorias profissionais, desde técnicos a cientistas têm demonstrado grande preocupação quanto ao futuro da humanidade e da vida no planeta terra. Sobretudo, quando refletimos a respeito das transformações ocorridas ao meio ambiente, que se configura como desastres ambientais tais como as secas, inundações, furacões, terremotos, entre outros, que vêm se tornando recorrentes no cotidiano das sociedades em diversos locais do mundo. No levantamento do referencial teórico desse trabalho, optou-se por refletir sobre a erosão hídrica apoiada na abordagem da Teoria de Risco. Pois, o cenário que se apresenta é, por um lado, o convívio das pessoas em ambientes de risco, sem perceberem o risco vivido. E, por outro, por considerarem as transformações ocorridas na natureza como simples acontecimento da dinâmica natural. Os desastres considerados naturais se tornaram frequentes no litoral Amazônico, em especial na Zona Costeira paraense. Segundo Santo (2011), na zona costeira paraense comprovou-se a existência de riscos ocasionados por fenômenos naturais como: tempestade, erosão e inundação, que são potencializados pelo desconhecimento das necessidades de ações do poder público no enfrentamento dos problemas de risco. Para alguns estudiosos como geógrafos, geólogos o desaparecimento gradativo da ilha da Coroa Comprida configura-se como um processo dinâmico da natureza, de construção e destruição da paisagem natural. Sob essa perspectiva o caráter de fragilidade é natural, descaracterizando o fundo político, social e econômico do problema ambiental. Quando o homem não está presente nessas regiões de risco (regiões propícias à ocorrência de desastres naturais) a natureza se transforma sem dar muito alarde. Quando o homem se faz presente conforma uma nova paisagem agregada de sentimentos e emoções, ocasionados pelo medo e insegurança provocados pela preocupação com os riscos à vida. Dessa maneira o evento ocorrido deixa de ser fenômeno natural e passa a ser categorizado como desastre natural, conforme Tominaga et al (2009, p.13) “Quando fenômenos naturais atingem áreas ou regiões habitadas pelo homem, causando-lhes danos, passam a ser chama desastres naturais.” No Glossário da Defesa Civil Nacional encontramos o conceito de desastre: “Resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem, sobre um ecossistema

42

(vulnerável), causando danos humanos, materiais e/ou ambientais e consequentes prejuízos econômicos e sociais”. (CASTRO, 1998, documento não paginado). Segundo o UN-ISDR (2009, p. 4) desastre pode ser considerado como: Uma interrupção grave do funcionamento de uma comunidade ou de uma sociedade, envolvendo perdas: humanas, materiais, econômicas ou ambientais. Que excede a capacidade das comunidades ou sociedade afetadas de lidar com os impactos através de seus próprios recursos.

De maneira geral os estudiosos conceituam desastres como sendo processos naturais, humanos (antropogênicos), ou tecnológicos que resultam de impactos que geram graves consequências aos sistemas sociais e ambientais, provocando às comunidades ou sociedades prejuízos tão severos que extrapolam a capacidade dos alcançados de habituar-se ao impacto causado em suas vidas. (SMITH, 2000; UNDP, 2004; MARCELINO ET AL, 2006 ; TOMINAGA ET AL, 2009). A Defesa Civil Nacional relaciona uma Codificação dos Desastres Ameaças e Riscos (CODAR), que faz a diferenciação geral sobre os tipos de desastres. Classificando os mesmos em três grandes grupos: Desastres Naturais, Desastres Humanos e Desastres Mistos. Os Desastres Naturais são gerados por fenômenos e desequilíbrios da natureza e causados por fatores de origem externa que atuam involuntariamente sobre a ação do homem. De um modo geral constitui-se de um fenômeno natural que pode ou não ter consequências influenciadas pela atividade humana. São citados: desastres ocasionados por causa eólica (como vendavais ou tempestades); relacionados com a geomorfologia (Erosão fluvial desbarrancamentos de rios e fenômenos de terras caídas, e erosão marinha); por desequilíbrio da biocenose (pragas animais, ratos domésticos). Os Desastres Humanos ou Antropogênicos são gerados por ações ou omissões dos homens. O homem é o próprio agente e autor. Em função disso, são causados por fatores de origem interna. Exemplos: desastres de natureza tecnológica (contaminação radioativa); de natureza social (relacionados com a destruição intencional da flora e da fauna). Já os Desastres Mistos são gerados por ações (ou omissão de ações) do homem, acarretando assim uma potencialização dos desastres naturais. Exemplos: desastres relacionados com a atmosfera (efeito estufa e chuvas ácidas); relacionados com a geodinâmica terrestre interna (salinização do solo). (CASTRO, 1998; MARCELINO ET AL, 2006; TOMINAGA ET AL, 2009). Desse modo, de maneira geral, os desastres são agentes capazes de produzir danos ao meio ambiente e também ao próprio homem, gerando desequilíbrios sociais, ambientais e

43

econômicos entre outros. No que dizer respeito, ao contexto do Brasil podemos dizer que a interpretação de desastre encontra-se diversificada em varias áreas de conhecimento, contudo optamos pelo viés sociológico, pois encontramos nessa área um entendimento que inclui o desastre como uma questão social e não somente como uma questão geofísica ou climatológica. Contudo, até na Sociologia a questão do desastre ainda encontra-se em eminente debate, não existindo um consenso formado (VALENCIO et al. , 2009). Certamente diante o exposto, podemos mencionar que há um diversificado debate sobre as interpretações de desastre no contexto nacional, o que seguramente dificulta a tomada de decisão dos gestores públicos sobre as medidas a serem tomadas em uma situação de desastre. Entretanto, podemos afirmar que no meio institucional da defesa civil desastre é reconhecido como: “desastre é, antes de tudo, o fenômeno de constatação pública de uma vulnerabilidade na relação do Estado com a sociedade diante o impacto de um fator de ameaça que não se conseguiu, a contento, impedir ou minorar os danos e prejuízos.” (VALENCIO et al. , 2009, p.5) O presente estudo de caso analisa um desastre, cuja codificação de acordo com os dados da defesa civil estadual é do tipo “Erosão Fluvial”, isto é, um desastre natural relacionado à geodinâmica terrestre interna.

3.2 OS DESASTRES NATURAIS E OS BANCOS DE DADOS MUNDIAIS

Para uma classificação dos desastres naturais, foi realizada pesquisa documental de dados da Defesa Civil; do Atlas Brasileiro de Desastres Naturais: são documentos que disponibilizam informações sobre os registros de desastres ocorridos em todo o território nacional nos últimos 20 anos; do livro Desastres naturais: conhecer para prevenir (2009); do livro Sociologia dos Desastres: Construção, interfaces e perspectivas no Brasil. Contudo, nossa intenção é a de apreciar apenas desastres naturais provocados por inundações e erosão fluvial que é a causa da problemática do presente trabalho. Quando ouvimos o termo desastre natural normalmente pensamos em fenômenos de grandes proporções, como, por exemplo, terremotos, furacões, tsunamis que são exemplos de desastres com significativo impacto ao meio ambiente natural, econômico e social. Desconsideramos assim, os outros fenômenos, de proporções menores atribuindo aos mesmos uma visão simplista que os trata pelo termo de “fenômeno natural”, pois o mesmo é visto como processo normal do cotidiano ambiental e da dinâmica da natureza. Essa interpretação deriva de um olhar da realidade a nível local, como fato isolado da realidade global.

44

Da totalização dessas situações, concordamos com o que diz Tominaga et al. (2009), além de associar o termo desastre ambiental a terremotos, ciclones e furacões dentre outros fenômenos de grande impacto, o associa também a fenômenos de proporções menores como inundações, erosões e deslizamentos esses causados pela natureza ou pela ação antrópica. Independente do nível do impacto, ou seja, de pequena ou de grande proporção, essas mudanças na natureza devem ser observadas por cientistas e governos a fim de evitar prejuízos e danos às comunidades existentes em áreas de risco. Uma vez que, os desastres naturais têm sido cada vez mais recorrentes na vida de muitas populações em vários locais do mundo. De acordo com Tominaga et al (2009, pg. 10) os desastres naturais de modo geral são: “Responsáveis por expressivos danos e perdas, de caráter social, econômico e ambiental, os desastres naturais têm tido uma recorrência e impactos cada vez mais intensos, o que os cientistas sugerem já ser resultado das mudanças climáticas globais.” Nessa mesma linha de pensamento, encontramos dentre outras discussões a de Valencio et al. (2009, p.20) que vai além de corroborar com Tominaga, pois aprofunda o discurso “Eventos extremos relacionados às mudanças climáticas – como intensas precipitações pluviométricas, vendavais, secas severas e desertificação, erosão marinha e afins – são parte constitutiva de ameaças que, no século XXI, colocarão em xeque a técnica.” Tal discurso coloca em xeque as organizações institucionais independente do nível de governo para lidar com os problemas sociais ocasionados pelas mudanças climáticas. Cabe destacar, que a realidade cotidiana no mundo inteiro mostra o aumento no número de desastres. Estes passaram a ser mais divulgados com o avanço dos sistemas de informações, sobretudo com o advento da internet. Dessa forma, as informações são disponibilizadas globalmente: seja a nível regional ou global, sejam grandes catástrofes ou até mesmo desastres de menor intensidade. Essa disseminação de informações resultou em um melhor armazenamento e até mesmo transmissão de dados sobre desastres. (ALEXANDER, 1997; SMITH, 2001; UNDP, 2004). Segundo Marcelino et al. (2006), esses dados, são importantes para serem utilizados de maneira a auxiliar os tomadores de decisão, a respeito de quais medidas devem ser adotadas para mitigar e prevenir um potencial desastre. Dessa forma, os bancos de dados desempenham a função de fornecer elementos para melhor compreensão dos desastres naturais, através da analise de seus comportamentos e de suas consequências.

45

Atualmente, existem bancos de dados globais e regionais. Dentre eles se sobressai o Emergency Events Database (EM-DAT6). Esse banco proporciona confiabilidade, devido à maneira que disponibiliza seus dados: pela qualidade dos dados e pela disponibilidade dos mesmos em meio eletrônico, agregado à clareza da metodologia utilizada para coleta e armazenamento. Outros bancos que trabalham com dados globais são: o NatCat situado em Munique, Alemanha e o Sigma, situado em Zurique, Suíça. Podemos dizer que baseados nas informações dos bancos de dados descritos acima, existe um consenso: nas últimas décadas ampliou-se o número de ocorrências de desastres naturais no mundo todo. (Marcelino et al , 2006). No Brasil, encontramos algumas tentativas de sistematização dos dados de desastres ocorridos em território nacional, como é o caso do “Atlas Brasileiro de Desastres Naturais” 7. Essa coletânea armazena informações de registros dos desastres sucedidos no território nacional durante o período de 1991 a 2010; é composto por 26 Volumes Estaduais e um Volume Brasil e estão disponíveis na internet. (Ministério de Integração Nacional, 2012). A análise dos documentos acima, nos evidenciou de modo geral o seguinte resultado: o banco de dados Brasileiro não registra a ocorrência de fenômenos de grande porte como: terremotos, furacões, entre outros. Os desastres de maior ocorrência no território nacional são sobre tudo os escorregamentos e as inundações, que despontaram no ranking de números de registros em diversos estados brasileiros. Apesar de serem considerados de pequeno porte, os mencionados desastres geram consequências significativas na vida dessas pessoas, como por exemplo, perdas econômicas, sociais e culturais. Entre os autores estudados, há um predomínio de opiniões sobre os fatores que influenciam no aumento, na intensidade e na frequência do número de desastres, nas últimas décadas em todo o globo terrestre. Dentre esses fatores estão: o crescimento populacional mundial, o intenso processo de urbanização, a ausência de ordenamento territorial, mudanças climáticas globais e elevação do nível do mar. entre outros. Estes configuram uma realidade fundamentada direta

6

Armazena dados de desastres sucedidos mundialmente desde 1900, foi “desenvolvido e administrado pelo Centre for Research on the Epidemiology of Disasters (CRED) da Universidade de Louvain” (Marcelino et al., 2006, p. 131). 7 As pesquisas foram efetivadas graças a acordo entre a Secretaria Nacional de Defesa Civil e o Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres da Universidade Federal de Santa Catarina. (Ministério da Integração Nacional, 2012).

46

ou indiretamente nas distintas intervenções antrópicas ao meio ambiente. (SMITH, 2001; UNDP, 2004; MARCELINO ET AL, 2006 ; MARQUES, 2007; TOMINAGA ET AL, 2009). Esse aumento no número de desastres pode ser visualizado na imagem elaborada por Marcelino et al, com os dados do EM-DAT, que demonstra a relação direta entre o crescimento populacional e o aumento no número de desastres em todo o mundo (Gráfico 1).

Gráfico 1 - Aumento dos desastres naturais e da população mundial (1900 – 2000)

Fonte: Marcelino et al. ( 2006).

3.2.1 Situações de Desastre no Estado do Pará

No estado do Pará, existem alguns registros de episódios de desastres. O levantamento dessas informações foi realizado através de consulta aos dados da Defesa Civil do Estado do Pará, e do Atlas Brasileiro de Desastres Naturais: Volume Pará. O Estado do Pará merece especial atenção, uma vez que compõe a zona costeira amazônica do território brasileiro e pelo número significativo de ocorrências de desastres naturais em regiões diversas dentro do limite territorial do estado paraense. O fato de ser componente da zona costeira brasileira lhe atribui características peculiares e especificas, entre elas: meteorológicas e oceanográficas, que contribuem para a maior incidência de registros de desastres no Estado. Apesar disso, os desastres ocorridos na região são considerados, como de pequena intensidade. Motivo esse que os configuram como percebidos isoladamente: somente em nível local, o que de uma forma geral, não os considera significantes o suficiente para comprovarem que a ocorrência dos mesmos encontra-se vinculada às mudanças globais.

47

No período de 20 anos (1991- 2000), registra-se no Estado a ocorrência de múltiplos eventos como: “estiagem e seca, erosão fluvial e linear, granizos, incêndios florestais, inundações bruscas e graduais, movimentos de massas e vendavais”. Os desastres mais frequentes dizem respeito às inundações graduais, que estão relacionadas à geomorfologia da região. Esse tipo de desastre é ocasionado pelas cheias dos rios, que são influênciados pelo excesso de chuvas característico da região. Esse desastre é avaliado como um dos maiores problemas do estado paraense, por ser diretamente relacionado com as variáveis climatológicas locais. Outros tipos de desastres citados são: inundações bruscas e alagamentos, erosão linear e fluvial, incêndio florestal, estiagem e seca. Essas ocorrências de desastres são acentuadas devido ao clima equatorial chuvoso e as características geomorfológicas da região (JUNGLES, 2011, p. 57). A margem percentual dos desastres pode ser visualizada no Gráfico abaixo, elaborada com os dados oficiais do Estado do Pará (Gráfico 2).

Gráfico 2 - Desastres naturais mais recorrentes no Pará

Fonte: Adaptado Jungles (2011).

Considerando as informações acima, podemos dizer que no estado do Pará as inundações são consideradas como um dos maiores problemas do estado, sendo agravadas pelas recorrentes chuvas (característica da região), pois afetam diretamente a vida de populações ribeirinhas, que tem seu habitat às margens dos rios. No entanto, o foco de nosso trabalho está em outra categoria de desastre, cujo tipo é a Erosão Fluvial que está classificada no gráfico acima como “outros”. O reconhecimento do desastre pelos órgãos competentes o aponta na área de estudo referente à dinâmica de processos erosivos, reconhecido segundo a Defesa Civil como erosão fluvial. (Tabela 1):

48

Tabela 1 - Portarias de Situação de Emergência (SE) e Estado de Calamidade Pública (ECP) Secretaria Nacional de Defesa Civil Municípios com Processos de Reconhecimento Situação de Emergência (SE) e Estado de Calamidade Pública (ECP) Estado: Pará COD. IBGE

Município

Nº Decreto Data do Decreto

Evento

SE/ECP SE

Situação

001

1500347

ÁGUA AZUL DO NORTE

068/2010

29/03/10

ENXURRADAS

RECONHECIDO

002

1500909

AUGUSTO CORRÊA

004

07/01/10

EROSÃO FLUVIAL¹ SE

RECONHECIDO

003

1502905

CURUÇÁ

018/2010

05/04/10

EROSÃO FLUVIAL¹

SE

RECONHECIDO

004

1502954

ELDORADO DOS CARAJÁS

008/10

14/04/10

ENCHENTES

SE

RECONHECIDO

005

1503606

ITAITUBA

063/2010

16/03/10

SALMONELOSES¹

SE

ENCERRADO

006

1504406

MARAPANIM

066/10

25/08/10

EROSÃO FLUVIAL¹

SE

RECONHECIDO

007

1504455

MEDICILÂNDIA

043/2010

18/04/10

ENXURRADAS

SE

RECONHECIDO

008

1505551

PAU D'ARCO

032/2010

27/01/10

ENXURRADAS

SE

RECONHECIDO

009

1505809

PORTEL

246/2010

05/07/10

EROSÃO FLUVIAL¹

SE

RECONHECIDO

010

1505908

PORTO DE MOZ

94/2010

14/06/10

ENCHENTES

SE

RECONHECIDO

011

1507003

SANTO ANTÔNIO DO TAUÁ 009/2010

22/02/10

ENXURRADAS

SE

RECONHECIDO

Fonte: Secretaria Nacional de Defesa Civil

Conforme o decreto de homologação8 da situação de emergência nas localidades de Coroa Comprida e Perimirim, a erosão é decorrente de influência do Oceano Atlântico na foz do Rio Urumajó, que é intensificada no período chuvoso que energiza a erosão, resultando em perdas materiais, desalojamento das famílias e coloca os habitantes de Coroa Comprida e Perimirim em elevado grau de risco. Esse tipo de risco tem se mostrado recorrente não somente no município de Augusto Corrêa. A este se acrescentam a enxurrada ou inundação brusca; desbarrancamento de rios; fenômeno das terras caídas; erosões laminar; e fluvial. Embora estiverem classificados como diferentes tipos, estes fenômenos possuem a mesma natureza geológica e estão sendo vividos ao longo da costa litorânea do estado (Tabela 2). No entanto, são observados de maneira individualizada, sendo analisadas somente sob a perspectiva local, não havendo um modelo de planejamento estratégico com medidas e ações necessárias para a gestão dos riscos, de maneira global e sistêmica.

8

A homologação do decreto esta disponível nos anexos do presente trabalho.

49

Tabela 2 - Desastres ocorridos no estado do Pará notificado à defesa civil nos anos de 2007, 2008, 2009, 2010. Municípios 2010 Afetados

Residências destruídas

Residências danificadas

Desabrigados

Desalojados

Data de Ocorrência

Denominação do evento

Augusto Corrêa 681

Bragança -

Curuçá 4.284

Santo Antonio do Tauá 789

2009

1.527

-

-

-

2008

527

7.000

-

-

2007

-

-

-

-

2010

5

-

-

2

2009

-

-

-

-

2008

-

-

-

-

2007

-

-

-

-

2010

15

-

-

5

2009

-

-

-

-

2008

-

-

-

-

2007

-

-

-

-

2010

13

-

-

13

2009

-

-

-

-

2008

-

-

-

-

2007

-

-

-

-

2010

31

-

-

16

2009

-

-

-

-

2008

-

-

-

-

2007

-

-

-

-

2010

5/jan

-

2/abr

20/fev

2009

20/abr

-

-

-

2008

7/jan

10/jan

-

-

2007

-

-

-

-

2010

EF. DR e FTC

-

ENX ou IB

2009

EF. DR e FTC

-

EF. DR e FTC -

2008

EF

EL

-

-

2007

-

-

-

-

-

Legenda: ENX OU IB: Enxurrada ou Inundação Brusca; EF. DR e FTC: Erosão Fluvial; Desbarrancamento de Rios e Fenômeno das Terras Caídas; EL: Erosão Laminar; E.F: Erosão Fluvial. Fonte: Santo (2011)

50

3.3 CONCEITO DE RISCO EM SISTEMAS NATURAIS

Atualmente muitos estudos estão adotando como base teórico-metodológica a Teoria de Risco, apesar disso ao construirmos o referencial teórico do presente trabalho notamos que não há um consenso sobre a definição conceitual de risco. No entanto, ao analisarmos a discussão, percebemos que com o passar do tempo, os riscos foram caracterizados recebendo assim diferentes adjetivos. Essa diferenciação serve para aumentar as discussões sobre como os prevenir. Entretanto, em todas as vertentes analisadas, observamos que a problemática de risco esta associada principalmente à maneira de como a sociedade se apropria do espaço. Optamos por discutir algumas das categorias envolvidas com a temática do presente trabalho - risco natural, risco social, vulnerabilidades – e tecer parte de nosso referencial com base na teoria sociológica. Foram analisadas as seguintes produções cientificas: Beck (1992, 1997) considerado pelos estudiosos da categoria risco como uma leitura obrigatória com o livro “A sociedade do risco”; e Egler9 (1996) e Villagran de León (2002), que discutem mais propriamente as categorias de risco. Para abranger o conceito de risco, os estudiosos utilizam variadas abordagens: desde a corrente intitulada objetivista, baseada em previsões do comportamento de sistemas complexos, que envolvem metodologicamente a probabilidade; até uma abordagem subjetivista de risco que considera os riscos somente com a existência das interações sociais. Essa última abordagem é a que mais se aproxima da interpretação utilizada no presente trabalho. (EGLER, 1996; LIEBER & ROMANO-LIEBER, 2002). Pois, essa abordagem considera ‘risco’ também como um fenômeno social. Não os limitando a fenômeno natural e/ou tecnológico. Essa opção de analise é corroborada segundo Valencio et al. (2009) e fundamentada no discurso de Beck, que considera os riscos através da existência de interações sociais, “o ‘ambiente’ soa como um contexto externo à ação humana. Porém, as questões ecológicas só vieram à tona porque o ‘ambiente’, na verdade, não se encontra mais alheio à vida social, humana, mas é completamente penetrado e reordenado por ela.” (BECK; GIDDENS; LASH, 1997, p.8). Beck (2010) discute risco na tentativa de alertar as sociedades para os potenciais riscos, principalmente tecnológicos e ambientais que as sociedades estão sujeitas. Em sua

9

Egler aborda risco ambiental de acordo com as dimensões e as características dos riscos ocorridos em zonas costeiras brasileiras, ele demonstra alguns resultados das análises das Cartas de Áreas de Risco Ambiental desenvolvidas para o Macrodiagnostico da Zona Costeira.

51

reflexão ele discute os riscos como consequências do processo de industrialização e de globalização. No âmbito de sua reflexão, no passado os riscos eram particulares a alguns indivíduos ou até mesmo grupos, o que ocorre de forma contraria na atualidade, uma vez que uma das características da sociedade de risco é decorrente ao processo de globalização que ultrapassa as fronteiras geográficas e produz riscos em escala global e os transferem as pessoas para os suportarem individualmente. Nesse sentido, o autor da ênfase a catástrofes ecológicas como um componente de identificação da “sociedade de risco”. Segundo Beck (1992, p.21), “O risco pode ser definido como uma forma sistemática de lidar com os perigos e as incertezas produzidos e introduzidos pela própria modernização”. Para ele a modernização da sociedade coloca os indivíduos em um contexto de permanente desconfiança, uma vez que os desastres não podem ter suas dimensões previstas de maneira total. O mesmo aponta para o avanço do progresso e da tecnologia, como sendo diretamente proporcionais ao crescimento de novas formas de risco, atribuindo os riscos às consequências das atividades da sociedade moderna. Desse modo, o risco passou a ser democrático, e inerente à forma de reprodução social das sociedades, refletindo diretamente na vida das pessoas, gerando nos indivíduos incertezas e inseguranças. Para Beck (1992) essas incertezas podem gerar possibilidades de acidentes ambientais que colocam em risco as condições da vida do planeta. A discussão levantada há décadas pelo escritor assume ainda hoje um caráter atual baseado em diversas discussões acadêmicas e com fortes contribuições de autores como Anthony Giddens e Scott Lash, que aprofundaram a discussão ainda sob o viés da “modernização reflexiva”. Que segundo Beck et al. (1997, p. 12) “‘Modernização reflexiva’ significa a possibilidade de uma (auto) destruição criativa para toda uma era: aquela sociedade industrial. O sujeito dessa destruição criativa não é a crise, mas a vitória da modernização ocidental.” Sob essa perspectiva os autores analisam as consequências do trabalho nas indústrias e suas consequências para a sociedade. Em meio a concepções e definições de risco o presente estudo baseou-se na proposição de Beck que é confluente com a definição de risco elaborada por alguns estudiosos que tratam os riscos como uma categoria que é socialmente construída, partindo de pressupostos de que o risco é percebido a partir de construções sócio-culturais, que envolvem as diferentes percepções de cada ator envolvido. Até porque não conhecemos todos os riscos, e não sabemos também se os mesmos são encarados de forma voluntária ou involuntária pelos atores. Esse contexto é fortemente influenciado pelas relações de poder e principalmente pelo modo como os atores encaram a convivência com o risco, uma vez que estes, em geral, têm

52

uma visão parcial e/ou incompleta dos riscos vividos. (DOUGLAS E WILDAVSKY, 1982; SILVA, 1998; AEROSA, 2008). Uma vez que existem grupos que resistem aos riscos, por exemplo, podemos citar dentre outros caso o presente estudo. Onde a comunidade pescadora da ilha da Coroa comprida sobreviveu durante um longo período de tempo com os riscos eminentes relacionados à erosão, sob a perspectiva de não deixarem a ilha. De acordo com Page (1978 apud Egler, p. 31) risco se relaciona “à incerteza e ao desconhecimento das verdadeiras dimensões do problema ambiental”. E, acrescenta Egler, (1996, p.31): Risco também expressa tanto à dimensão social de eventos catastróficos, como a percepção individual de seus efeitos. Como tal, é uma ponte entre o poder público e o privado que pode subsidiar a tomada de decisões sobre alternativas de desenvolvimento tecnológico e de alocação do gasto público em condições democráticas de gestão do território. (EGLER, 1996, p.32).

Nesse sentido, refere-se ainda a medidas que podem ser tomadas, se incluirmos a temática de risco nas decisões dos gestores institucionais de organizações públicas ou privadas. Uma vez que, conforme Ramos (2011, p.32) “Os riscos já são publicamente assumidos por cientistas, sendo também notória a incapacidade de muitos Estados em fornecer a adequada proteção aos seus nacionais afetados pelas mudanças ambientais, muitas delas irreversíveis”. A autora salienta que o padrão atual de desenvolvimento proporciona a ocorrência de desastres. Na mesma direção, Aerosa (2008) salienta que a temática de risco só passa a ter uma visibilidade social a partir do momento em que os riscos se transformam em desastres, ou até mesmo acidentes graves. Percebendo a necessidade de medidas de proteção as populações residentes em áreas de risco, deverão ser tomadas algumas medidas para garantir a segurança das mesmas, logo “há a necessidade de inserção da temática de risco natural nos atuais planos diretores municipais, e também uma cartografia dos riscos para orientar e facilitar as comunidades locais na visualização das informações reunidas na leitura técnica e comunitária.” SANTO (2011, p.68). Pode-se observar no estudo de Egler uma espécie de previsão sobre acontecimentos em uma escala nacional, considerando as condições ambientais e sociais das zonas costeiras brasileiras, especificamente sua gestão desde a escala local até a escala global. O autor considera como indicadores de risco: vulnerabilidade dos sistemas naturais, densidade da estrutura produtiva, criticidade das condições de habitabilidade. Ele identifica que “as condições criticas de habitabilidade são responsáveis pelos maiores indicadores de

53

risco em praticamente toda a costa brasileira.” E acrescenta que na zona costeira diversos são os fatores que determinam que “a qualidade de água para contato primário e secundário é o principal fator de risco ambiental para a vida humana, a longo prazo e com dimensões nacionais, na Zona Costeira brasileira” (EGLER, 1996, p.35). Em sua abordagem Egler (1996) classifica o Risco Ambiental em três categorias básicas: risco natural, risco tecnológico e risco social.

3.3.1 Risco natural

Em sua reflexão Egler nos afirma que o conceito de risco natural está baseado no funcionamento dos sistemas naturais. Nesse sentido, Egler (1996, p.34) diz que Risco natural esta “associado ao comportamento dinâmico dos sistemas naturais, isto é, considerando o seu grau de estabilidade/instabilidade expresso na sua vulnerabilidade a eventos críticos de curta ou longa duração, tais como inundações, desabamentos e aceleração de processos erosivos”. Na concepção de Villagran de León (2002), os riscos naturais são tratados levando em consideração os fenômenos naturais e as condições sociais. O mesmo relata que uma cidade, região ou um país, estão em risco quando há uma combinação de fatores naturais e de condições sociais, que torna a sociedade propensa a riscos naturais, pois a mesma não dispõe de medidas adequadas para minimizar o impacto dos desastres. No caso do município de Augusto Corrêa e especificamente o da Ilha da Coroa Comprida ocorre em longo prazo à destruição da paisagem costeira nos períodos em que ocorrem as ressacas do mar, agregadas a erosões hídricas. As construções existentes não suportam a força das ondas, que destroem todas as edificações existentes na ilha, o que nesse contexto expõe a comunidade a outros riscos, ente eles os riscos sociais, uma vez que os mesmos passa a passa a ser vistos como as categorias: desabrigados e/ou desalojados. Conforme Valencio et al. (2009) a construção da realidade social de risco ambiental é situada no contexto de risco social.

3.3.2 Risco social

Conforme Castro et al. (2005), o risco social pode ser visto sob duas concepções distintas. A primeira considera risco social como potencial dano a uma sociedade (ou parte da mesma) que a própria pode se causar. Neste caso podemos citar como exemplo as guerras.

54

A segunda diz respeito ao risco atribuído a carências sociais que conduzem à deterioração das condições de vida da sociedade, de modo que as necessidades básicas apresentam um déficit, não atingindo as condições necessárias e mínimas para o desenvolvimento humano. Egler define risco social da seguinte maneira: Visto como resultante das carências sociais ao pleno desenvolvimento humano que contribuem para a degradação das condições de vida. Sua manifestação mais aparente está nas condições de habitalidade, expressa no acesso aos serviços básicos, tais como água tratada, esgotamento de resíduos e coleta de lixo. No entanto, em uma visão a longo prazo pode atingir as condições de emprego, renda e capacidade técnica da população local, como elementos fundamentais em pleno desenvolvimento humano sustentável. (EGLER, 1996, p.34).

Conforme Vieillard-Baron (2007 apud Dagnino, Junior 2007, p.59) podemos qualificar risco social “quer nos atenhamos às suas causas sociais, quer atentemos para suas consequências humanas”. O autor classifica risco social como: “endógenos - relacionados aos elementos naturais e às ameaças externas” (como terremotos, epidemias, secas e inundações); e “exógenos - relacionados diretamente ao produto das sociedades e às formas de política e administração adotadas”, (crescimento urbano e a industrialização, a formação de povoamentos e a densidade excessiva de alguns bairros). Podemos citar também, exemplos de riscos sociais que acometem a sociedade: o deslocamento compulsório, os empregos precários ou mal pagos, habitações fragilizadas, miséria entre outros.

3.3.3 Vulnerabilidade

Tapsell (2010) define vulnerabilidade como o estado de um sistema antes de um evento desencadear uma catástrofe. Para o autor, o estado de vulnerabilidade é considerado como um período inseguro, visto que a situação vivida pelo sistema natural é de instabilidade, ou seja, todos que vivem em áreas de riscos são vulneráveis, a impactos sociais e perigos. O autor diz, ainda, que esse momento pode ser definido também em termos da probabilidade de perdas sob a forma de prejuízos econômicos ou de vida humana. No Glossário da Defesa Civil Nacional o conceito de vulnerabilidade: “Corresponde ao nível de insegurança intrínseca de um cenário de desastre a um evento adverso determinado. Vulnerabilidade é o inverso da segurança”. (CASTRO, 1998, documento não paginado). Ou seja, vulnerabilidade é caracterizada como sendo uma situação

55

de insegurança de uma comunidade, ou sistema natural, a uma potencial ameaça de risco ou desastre. A situação de vulnerabilidade não deve ser considerada como sinônimo de pobreza. A pobreza está relacionada às necessidades das pessoas, e a vulnerabilidade à condição de preparo no enfrentamento dos fenômenos. Contudo, podemos dizer que certas situações de vulnerabilidade podem contribuir para um aumento na pobreza, acentuando assim as desigualdades sociais. (LAMPIS, 2010; SANTO, 2011) Assim sendo, o conceito de vulnerabilidade pode ser apontada segundo Valencio et al. (2006, p.98) “uma possibilidade de um grupo social sofrer danos – seja por insuficiência das estratégias de antecipação, prevenção, resposta ou recuperação diante de um fator de ameaça”. Sob essa perspectiva, podemos citar a Ilha de Coroa Comprida como um cenário, ou área geográfica, que enfrenta uma situação de vulnerabilidade, decorrente da instabilidade do sistema natural, das inadequadas condições sociais para enfrentá-lo e da insegurança gerada para a comunidade ali existente. Vale ressaltar, que a realidade vivida por essa comunidade os conforma a situação semelhante à de refugiados ambientais.

3.4

REFUGIADOS AMBIENTAIS Para entendermos o termo “Refugiados Ambientais”, inicialmente é necessário

compreender o termo que antecede a discussão, que é a categoria: “refugiado”. Perceber a situação de um refugiado é no tocante entender a condição de pessoas que necessitam de proteção. Portanto, podemos dizer que “a temática dos refugiados, ou seja, de seres humanos que precisam buscar proteção em outro território que não o de sua origem ou residência habitual, em função de perseguições que sofrem, existe desde o século XV.” (JUBILUT, 2007, p.23). Dessa forma, adicionaremos ao discurso que diz Garcia (2007, p.53): “tem suas origens na própria trajetória da humanidade sobre a Terra, nos tempos bíblicos já encontramos referências a essas pessoas que por motivos alheios a sua vontade se veem impelidos a deixar a sua Terra Mater para buscar segurança ou vida em terras estrangeiras”. O processo de regulamentação da situação dos refugiados tem seu inicio a partir do século XX, com a inserção do assunto nos debates de comunidades internacionais. Passouse então “a refletir sobre a inviolabilidade da dignidade de cada ser humano” a partir dos “horrores e crimes penetrados durante as duas guerras mundiais”. Com a finalidade de

56

proteção e promoção dos direitos das pessoas foram criados: As Nações Unidas (1946) e a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e o Alto Comissariados das Nações Unidas para os refugiados (ACNUR) e foi aprovada a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados (MILESI, 2003, p.13). O status de refugiado é informação da Convenção de Genebra de 1951, e o Protocolo sobre o Estatuto de Refugiados de New York (1967). Desse modo, baseado no artigo 1° da Convenção, Oliveira (2010, p.124) define o termo refugiado: “o termo refugiado vem a designar todas e quaisquer pessoas que em consequência de devidos e fundados temores e receios, em razão de serem perseguidas em virtude de sua raça, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou das suas opiniões políticas; e que se encontre fora do país de sua nacionalidade e encontrando-se fora do país no qual tinha a sua residência habitual, não possa, ou em virtude daqueles acontecimentos, não queira regressar a ele.”

Na atualidade o conceito acima descrito sofreu algumas alterações para abarcar outras formas de perseguições, o conceito de refugiado utilizado pela ACNUR (2011): diz que refugiado é alguém que “temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país”. Deste modo, não visualizamos nas definições acima descritas, fundamentos que abarquem o meio ambiente. Contudo, no mundo inteiro questões ambientais têm obrigado pessoas a migrar de seus locais de origem. Nesse contexto, que começa a se desenhar o termo refugiados ambientais. Podemos então citar o que diz Garcia: Todos os dias milhões de pessoas abandonam seus lares em busca de um mínimo de dignidade. Os motivos são os mais variados. Uns fogem da violência física que ameaça a vida, outros por sua vez são obrigados a partir, pois pensaram diferente do establisment. Há aqueles também que fogem do flagelo da fome e das intempéries naturais. Esses são os refugiados, que sob diversas denominações ocupam a maioria dos noticiários mundiais, servindo até mesmo, como podemos ver, de roteiro de filmes. (Garcia, 2007, p.11).

Surge então à temática dos refugiados ambientais, denota estreita relação com a temática do meio ambiente. Assim os compromissos, de preservação e conservação do meio ambiente são extremamente necessários à manutenção da vida. Segundo Milesi (2003, p.14) “Atualmente, o conceito de refugiado é objeto de questionamentos perante a insurgência de novos desafios. A depredação e a poluição do meio ambiente, com todas as consequências que acarretam, provocaram a formação dos assim chamados refugiados ambientais”.

57

O debate sobre o tema refugiados ambientais, tem ganhado cada vez mais destaque em diversos campos de discussão, uma vez que podemos afirmar baseado na literatura estudada, é que a categoria refugiado ambiental possui acentuada relação com as questões que envolvem o meio ambiente. Nessa perspectiva, podemos citar o que diz Milesi (2003, p.15): A degradação e a poluição do meio ambiente, com todas as consequências que acarretam, provocam a formação dos assim chamados ‘refugiados ambientais’. Eles não fogem de um conflito armado ou de perseguição de poder político, mas da seca, da desertificação do território ou de outras catástrofes naturais.

A literatura sobre o assunto é recorrente no sentido exposto acima. Seguinte à necessidade de revisão ao conceito de refugiado. Para Peixer (2011) “termo refugiado expressa a natureza – forçada – do deslocamento populacional; ao passo que o termo “migrante” reflete a voluntariedade do movimento.” Ainda segundo o autor, o caráter do “termo refugiado ambiental é essencial, já que implica proteção e assistência a essas pessoas. Em sua essência, o asilo é conferido a pessoas que fogem de situações de vida consideradas inviáveis, buscando segurança”. Conforme Oliveira (2010), no ano de 1972, em Estolcomo, ocorreu a Conferência da ONU (Organização das Nações Unidas), que originou a Declaração de Estolcomo sobre o Meio Ambiente Humano e instituiu o Programa das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente (PNUMA). Este tinha como objetivo “monitorar o avanço dos problemas ambientais no mundo. No documento que aprovou a criação do PNUMA, foi introduzida a expressão Environmental Refugees10 – Refugiados ambientais.” A referida expressão é definida por Essan El-Hinnawi como: “pessoas que são forçadas a deixar seu habitat tradicional, temporária ou permanentemente, devido a distúrbio ambienta (natural e/ou provocado por pessoas) que colocou em risco sua existência e/ou afetou seriamente a qualidade de vida”. Então, de acordo com Raiol (2010, p.160), a partir do conceito acima se delimitam os elementos essenciais para a definição de refugiados ambientais. A primeira condição de refugiado ambiental então seria “a pessoa ser forçada a deixar seu habitat

10

Foi Essam El-Hinnawi, quem difundiu a expressão “refugiados ambientais”, o mesmo percebe uma estreita relação entre os problemas ambientais e os deslocamentos de indivíduos ou de comunidades inteiras. O autor argumenta que os problemas ambientais que afetam o ambiente físico natural das áreas onde vivem as comunidades atingidas ocasionam problemas sociais, econômicos e culturais que causam o deslocamento. ELHINNAWI, Essam. Environmental Refugees. Nairobi: United Nations Environment Programme - UNEP, 1985, p. 05.

58

tradicional”. A segunda condição baseia-se no motivo: distúrbio ambiental11 natural e/ou provocado por pessoas”. Sob essa perspectiva, incluiu nessa categoria: “construção de uma usina hidrelétrica, elevação grave do nível das águas de mares ou oceanos, contaminação de um rio que serve a uma comunidade ou a explosão de um reator nuclear (como Chernobyl).” A terceira condição é “‘o distúrbio ambiental’ deve ser de tal monta que ‘coloque em risco a existência e/ou afete seriamente a qualidade de vida’ dos atingidos por ele” RAIOL (2010, p.161). É à luz da definição acima descrita que poderíamos considerar os deslocados da ilha da Coroa Comprida como refugiados ambientais. Situação semelhante causa mobilidade em vários outros locais do mundo. Referencia ao contexto de refugiados ambientais e semelhante ao caso estudado, são entre outros os casos das Ilhas Maldivas (no Oceano Índico), Ilhas Marshall, Tuvalu e Kiribati (Oceano Pacífico). Considerados Pequenos Estados-Insulares vivem a situação de deslocamento devido ao desaparecimento de seu território graças à elevação do nível dos oceanos, contudo a transferência da sede dos respectivos governos e a evacuação dessa população será feita com a significativa repercussão dos aspectos políticos, sociais, econômicos e jurídicos e com a devida atenção aos envolvidos nesse processo (RAMOS, 2011). A categoria dos refugiados ambientais, como se sabe, não consta expressamente da definição da Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951, nem no Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967. Por esta razão, a eles não se aplicariam os instrumentos legais para os refugiados definidos na convenção. Contudo, a ampliação das discussões tem influenciado positivamente para um futuro reconhecimento da categoria. Segundo Ramos (2011, p. 22) “A Organização das Nações Unidas (ONU), por meio de seus organismos e agências especializadas, admite que os "refugiados ambientais" fazem parte de uma categoria em franca expansão e que necessitam de assistência”. Contudo, apesar de todos os debates e de situações reais que elucidem os refugiados de consequências de desastres ambientais, segundo Magalhães (2008), essa categoria permanece ainda nos dias atuais “como uma categoria sócia política”, apesar de “os deslocamentos compulsórios no âmbito do mesmo país provocam situações similares àquelas

11

Raiol (2010) restringe o distúrbio ambiental “àquelas mudanças físicas, químicas ou biológicas que se processam no ecossistema”.

59

inter-países, devendo ser atribuído às pessoas que experimentam estes deslocamentos o mesmo estatuto” (MAGALHÃES, 2008). Esse não reconhecimento pelo direito internacional de acordo com Ramos (2011, p.22) “é devido à categoria não esta incluída no conceito tradicional de refugiado da Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados, celebrada em Genebra de 1951, nem no respectivo Protocolo de 1967, relativo ao Estatuto dos Refugiados”. Tais pessoas, portanto, estão desamparadas de proteção internacional específica, uma vez que não se enquadram na proteção concedida pelo Direito Internacional dos Refugiados, estando em situação similar a dos “migrantes econômicos”. De todo modo, o que parece importante ressaltar é que a construção da categoria que ainda se encontra em processo faz alusão a direitos e deveres que devem ser assumidos e assegurados pelo poder público. Isto significa dizer, que se trata de um problema ou de uma questão que se instaura no campo político e que demanda definições políticas, e fundos financeiros e econômicos para a sua solução.

60

CAPÍTULO IV –

DESCRIÇÃO DO FENÔMENO DO PONTO DE VISTA

GEOFÍSICO (IMAGEM DE SATÉLITE) 4.1

SURGIMENTO DO FENÔMENO DE EROSÃO NA MÍDIA LOCAL

Embora, haja dificuldade para o acesso à ilha, devido ao mesmo ser feito somente por via fluvial, em embarcação própria ou fretada, a ilha passou a ter visibilidade em nível regional, por estar sofrendo um desastre. A mídia local do estado do Pará pôde oferecer uma maior visibilidade à situação de desastre vivida no município de Augusto Corrêa em duas localidades distintas: na vila de pescadores de Coroa Comprida e também em Perimirim. Ocorre que, os dados disponíveis no Banco de Dados de Registros de Desastres (onde estão incluídos todos os documentos levantados durante a execução do PNGR Planejamento Nacional para Gestão de Riscos), estão disponíveis vários documentos correspondentes à situação ocorrida em Perimirim, talvez, por essa localidade fazer parte integrante do continente estando situada há 09 km da sede do município, e podendo ser acessado por via terrestre. Diferentemente de dados relacionados à nossa área de estudo, que devido sua distancia da sede do município e a dificuldade de acesso à ilha, possui uma incidência menor de registros. Outro fator que minimiza a formalização de ocorrências de desastres na ilha está relacionado à ausência de um órgão da Defesa Civil no município de Augusto Corrêa. A ocorrência de desastres é registrada no órgão de Bragança município vizinho que tende as demandas dos dois municípios. Os relatos de jornais do estado do Pará anunciam que a ilha há aproximadamente 30 anos sofre com o processo de erosão hídrica e por esse motivo está sendo “devorada pelo mar”. Por essa causa, famílias inteiras que residiam na ilha estão se deslocando para outros destinos. (MENDES, 2010). Pelo que foi possível pesquisar, as noticias na mídia impressa datam de 2010. Uma das primeiras reportagens ocorreu devido ao atual prefeito da cidade, em seu segundo mandato, decretar situação de emergência. Alguns jornais de grande circulação no estado do Pará relatam a situação dos moradores em questão e o processo que vem ocorrendo na ilha, com algumas manchetes descritas no quadro abaixo:

61

Quadro 1 - Notícias do jornal O Liberal e da página da ORM (Organização Rômulo Maiorana) on line sobre a Ilha da Coroa Comprida e o fenômeno da erosão hídrica.

“Ilha é engolida pelo oceano Atlântico” Edição de 18/01/2010

Erosão Coroa Comprida, em Augusto Corrêa, está sendo devorada lentamente pelo mar. “Ilha no Pará pode sumir com o vento e a maré” Das 50 casas que estavam na areia, apenas 20 ainda estão de pé Edição 22/01/2010

“Ilha some do mapa e desaloja famílias” Edição de 08/02/2010

FENÔMENO - Defesa Civil vai à Coroa Comprida para convencer pescador a sair

A mídia televisiva também noticiou - reportagem exibida no jornal da rede “Record” do dia 21 de janeiro de 2010: “A faixa de areia da ilha chegou a medir quase 1 km. Mas o mar já engoliu mais de 90% da praia, arrastando as casas que estavam no caminho”. A reportagem era de Cassiano Rolim, que na época entrevistou alguns moradores da ilha e também um geólogo do Instituto de Geociências da UFPA que deu o seguinte parecer sobre as mundanças ocorridas na ilha, dizendo que “a ilha é vitima da maré e do vento que tanto trazem como levam areia”: “Nós podemos ter cem anos, duzentos anos ou até mais num periodo de construção e depois o relógio marca o inicio da destruição, ai então todo aquele processo de construção pode vir a ser destruido.” Cabe ressaltar, que essa linha de pensamento do geólogo entrevistado, é defendida por alguns estudiosos, que tratam a situaçao como “fenômeno natural”, tratado assim como uma situçao normal da natureza que é simplesmente provocado pela dinâmica das águas. Essa linha de pensamento desconsiderando a presença do ser humano na área atingida, o que tranforma o fenômeno em desastre e demanda medidas de prevenção e proteçao civil para os atingidos. Podemos citar o que diz Ramos (2011, p. 19): Nesse sentido, parece evidente que, dentre as inúmeras dimensões a serem consideradas em um contexto de drásticas mudanças do ambiente natural, encontrase a dimensão humana, uma vez que os deslocamentos populacionais forçados motivados por causas ambientais demandam uma atenção não menos cuidadosa que o aspecto econômico, político e sociocultural da degradação ambiental global.

Então em 2010 passou-se a questionar a solução do deslocamento compulsório (MENDES, 2010): A maioria das famílias que mora na Coroa Comprida alega que se forem remanejadas para o litoral, na área urbana de Augusto Corrêa, não vão conseguir se

62

adaptar à cidade, pois na ilha o peixe, o caranguejo, o camarão e o siri garantem uma sobrevivência tranquila. 'A gente só está aqui ainda porque não temos para onde ir. Só Deus e os homens é que podem nos ajudar', disse Tereza Monteiro, de 76 anos, 50 deles vividos na ilha, desde que chegou de Candido Mendes, no Maranhão. 'Ir para a cidade passar fome? Prefiro ficar aqui, me mudar para dentro do mangal', diz Teresa. 'Aqui não tem mais futuro para a gente, a água está nos expulsando', emenda Miguel Farias, pescador que há quatro décadas mora na ilha, e é um dos que já decidiram abandonar o lugar.

Nesse mesmo ano, no banco de dados de Registros de Desastres esta disponível o Formulário de Avaliação de Danos – AVADAN. Com a data de ocorrência do dia 05/01/2010, de denomina a incidência de desastre de Erosão Fluvial - Desbarrancamentos de rios e fenômenos de Terras Caídas, cuja área afetada descrita é a Orla da Vila de Perimirim e Coroa Comprida. Segundo o documento, o fenômeno “provocou a inundação parcial da Ilha.”. Cuja causa do desastre é o “Fenômeno de Terras Caídas, onde a água atuando nas margens do rio em terreno sedimentar de natureza arenosa provoca um trabalho subterrâneo de erosão.” MI (2012). Relatos de jornal local nos mostram situação de emergência também na vila de Perimirim, em passagem descrita por Mendes (2012): “O medo maior da gente é agora no mês de março", afirma o pescador Celso Luiz, o Sasaca. Ele é um dos quase 1.200 moradores da pequena vila de Peri Mirim, em Augusto Corrêa, que vivem o drama das águas grandes que se aproximam, as famosas águas de março, o que deve acontecer nos próximos dias. Um drama que já vem se arrastando há décadas, que deixa todo mundo sem dormir quando a maré é grande pela madrugada afora, mas que tem se intensificado porque a prefeitura do município ainda não concluiu o cais de arrimo que, completo nos seus mais de 600 metros de extensão, evitaria o desbarrancamento da orla daquela vila de pescadores”.

Contudo, nos limitamos a estudar especificamente a situaçao vivida na vila de Coroa Comprida. Analisando e caracterizando o desastre e descrevendo seus efeitos a população atingida e as medidas por eles tomada.

4.2 DESCRIÇÃO DO FENÔMENO DO PONTO DE VISTA GEOFÍSICO 4.2.1 Erosão Fluvial – o desastre que ocorre na área de estudo

A dinâmica natural da paisagem litorânea tem sido muito intensa nos últimos anos, o que vem provacando mudanças significativas ao meio ambiente, em diversos lugares

63

do mundo todo incluise na costa brasileira, o que inclui a paraense. A ação do mar tem provocado intensas modificações, gerando cada vez mais a degradação ambiental dos ecossistemas costeiros, entre eles recifes de corais e manguezais. Segundo Atlas do Meio Ambiente (2010, p.54):

Na Europa, um quinto das praias e falésias é atingido pela erosão. São cerca de 20 mil quilometros. Entre os países mais afetados estao Polônia, Letônia, Chipre e Grécia. Na França, o processo pode ser visto em 25% do litoral, ou seja, em 1.720 quilômetros habitados por 7 mil habitantes. Números semelhantes continuam crescendo no mundo todo. As ilhas de coral, os deltas e os mangues estao entre os territorios mais expostos.

Embora, a

mobilidade da costa seja apreciada como um fenômeno natural

ocasionado pelo movimento das ondas e ventos, a erosão é considerada uma ameaça há ilha e litorais e deltas. A erosão se agrava, dentre outros fatores: devido as mudanças climáticas e há especulação imobiliária que potencializa o ocupaçao territorial. Podemos citar, por exemplo, a construçao de portos, imoveis, a urbanizaçao e pavimentaçao dos solos, e “obras de proteçao o que pertuba profundamente as correntes marinhas e transportes de sedimentos”. (ATLAS DO MEIO AMBIENTE, 2010, p.54). Para o melhor entendimento do processo que esta ocorrendo na área de estudo, precisamos primeiramente definir erosão. Para isso, escolhemos alguns autores como Galeti(1931) e Guerra (1999), entre outros que serão citados. No Glossário da Defesa Civil Nacional encontramos a definição de erosão como: “desagregação e remoção do solo ou de rochas, pela ação da água, vento, gelo e/ou organismos (plantas e animais).” (Castro, 1998, documento não paginado). A erosão do solo pelas águas das chuvas é o mais comum tipo de erosão que acontece no mundo, sendo denominado de erosão hídrica. Diferentes fatores conduzem à perda dos solos: o clima, solo, relevo e vegetação. A perda do solo quando ocasionada por erosão hídrica consiste em transferências de energias e matérias provocadas por um desequilíbrio do sistema natural, que integra: água/solo/cobertura vegetal. (GALETI,1931; GUERRA, et al., 1999). Todos os conceitos estudados sobre erosão hídrica nos levaram a fazer um generalização sobre o fenômeno. Podemos considerar a erosão como um conjunto de forças que agem sobre um determinado ambiente causando a degradação do solo. A erosão é considerada um processo complexo que pode ocorrer através das seguintes etapas: desagregação, transporte e sedimentação, que não necessariamente ocorrem ao mesmo tempo.

64

Esse processo é agravado pela chuva: a incidência das gotas no solo geram rupturas nos componentes do solo (agregados) que ficam dispersos e vulneráveis, sendo jogados para os lados e para cima, e daí transportados para outros lugares (GALETI,1931; GUERRA, et al., 1999; CASTRO, 1998; VALLE JÚNIOR, 2008; VASCONCELOS, 2010). Segundo Guerra, et al. (1999) a erosão apresenta um diversificado número de tipos, dentre eles podemos citar a erosão antrópica, eólica, fluvial, laminar, marinha. Na área de estudo configuram-se como principais fenômenos a erosão hídrica, agregada à erosão eolica e ao aumento do nivel das marés. Contudo, nos limitamos a tratar nesse trabalho somente sobre a erosão fluvial, uma vez que foi o tipo de erosão reconhecido pela Defesa Civil do município. Segundo Silva et al (2008), a erosão fluvial pode ocorrer desde o leito até as margens dos rios. Este autor atribui a erosão à ação das águas agregada ao atrito de materias transportados; é causada pelos rios, especialmente na época de cheias e, dependendo de sua intensidade, poderá destruir as margens por solapamento12 ou escorregamento. Em Jungles (2011 p. 43) encontramos a seguinte definição: “ A erosão fluvial corresponde ao processo erosivo que ocorre na calha dos rios e enquadra-se em desastres naturais relacionados com a geomorfologia, o inteperismo13, a erosão e acomodação do solo” É um processo que resulta das ações dos rios sobre a superfície terrestre; tem início com a erosão laminar, seguida por sulcos ou ravinas, depois pela erosão fluvial, que é um trabalho efetuado por quatro mecanismos: Um deles é a ação hidráulica da água, que ocorre quando a corrente hídrica é suficientemente forte, levando pelo curso do rio areia e detritos de rochas, depositados no leito do rio, prosseguindo assim até uma nova sedimentação e de uma nova intensificação da corrente hídrica. A ação corrosiva das partículas em suspensão na água ocorre quando fragmentos de rocha ou areia, em suspensão no fluxo, atritam sobre camadas rochosas das margens e dos fundos dos rios, provocando escavação das mesmas. Já a ação abrasiva é o processo onde o material em trânsito nos rios é erodido, formando partículas cada vez menores ao atritar com superfícies rochosas, formando pedras roladas, cascalhos, areia grossa, areia fina pela suspensão e transporte das partículas na água. E por ultimo, a corrosão ou diluição química, processo segundo o qual a água, na condição de solvente universal, dilui os sais solúveis, liberados das rochas, em consequência da ação mecânica, e os transporta sob a forma de soluções (CASTRO, 2003 apud JUNGLES, 2011 p. 43).

12

Solapamento: Queda das encostas provocadas pelo aprofundamento das calhas fluviais e erosões das margens dos cursos d' água. Solapamento são as erosões em margens de rios. (Dicionário eletrônico Informal) 13 Intemperismo: Conjunto de processos condicionados pela ação de agentes atmosféricos e biológicos que ocasionam a destruição física e a decomposição química de minerais e rochas. (Dicionário eletrônico Michaelis).

65

Para Guerra et al. (2010) as características do solo influenciam no processo erosivo. Essa influência determina se o solo possui maior ou menor resistência à ação dos processos erosivos, esse se constitui como o principal fator natural relacionado à erosão. Sua influência deve-se às suas propriedades físicas, textura, permeabilidade, consistência e matéria orgânica. Outra característica relevante ao processo erosivo, diz respeito à quantidade pluviométrica de chuvas, sua intensidade e sazonalidade. As chuvas podem ser consideradas como uma das maiores interferências da erosão, podendo “também ser associadas a desastres como inundações, deslizamentos, contaminação de corpos d’água, descargas elétricas, vendavais e outros.” (VALENCIO ET AL. 2006, p. 98). 4.2.2 Erosão Fluvial no estado do Pará O Atlas Brasileiro de Desastres Naturais - Volume PARÁ disponibiliza informações sobre os registros de desastres ocorridos nos últimos 20 anos, e entre os desastres encontram-se informações sobre erosão fluvial. Segundo este documento, foram oficializados 20 registros de desastre por erosão fluvial entre o período de 1991 a 2010. Os municípios mais afetados do estado estão distribuídos nas mesorregiões Sudeste Paraense, Nordeste Paraense, Marajó e Baixo Amazonas, tendo em suas estatísticas o município de Augusto Corrêa como o mais atingido. Segundo o período analisado, a frequência da erosão fluvial é de forma geral em todos os meses do ano e com frequência maior no mês de novembro (Gráfico 3). Gráfico 3 - Frequência mensal de erosão fluvial no estado do Pará, período de 1991 a 2010.

Fonte: Jungles (2011).

Na região paraense o processo de erosão fluvial torna-se mais grave porque afeta as habitações e as construções existentes nas margens dos rios, onde se concentra boa parte da população. Verificam-se assim importantes perdas materiais e imateriais, mas, principalmente produz alterações no modo de vida das populações atingidas por desastres.

66

O quadro abaixo relaciona informações dos danos causados por erosão fluvial nos municípios paraenses (Gráfico 4). Gráfico 4 - Danos humanos ocasionados por erosão fluvial no estado do Pará, período de 1991 a 2010.

Fonte: Jungles (2011).

No gráfico acima, observa-se que no período de vinte anos, um total de 35.081 habitantes viveram este tipo de desastre, ficando 58 pessoas desabrigadas, 96 desalojados, 406 deslocadas e 34.721 foram afetadas. (JUNGLES, 2011 p. 44). O agravamento dos desastres naturais é diretamente relacionado com a intervenção humana. Em especial devido à ocupação desordenada do território, que permite a ocupação de áreas adjacentes aos rios. A presença do homem nessas regiões em pequena escala, interfere no desastre, uma vez que o homem planta, desmata, constrói, necessita do trânsito de embarcações com uma demanda cada vez maior, para o atendimento de suas necessidades. Esses fatores tendem a acelerar a intensidade dos desastres, gerando normalmente consequências para o meio ambiente e a sociedade. (VALLE JÚNIOR, 2008; JUNGLES, 2011; SANTO, 2011). 4.2.3 Erosão Fluvial no município de Augusto Corrêa – Ilha da Coroa Comprida

De acordo com a Defesa Civil o município de Augusto Corrêa enfrenta não somente o processo de erosão fluvial, mas também desbarrancamentos de rios e fenômenos de terras caídas em algumas áreas de seu território, sobretudo na ilha da Coroa Comprida e Perimirim. O levantamento dos dados feito pela defesa civil mostrou o município como o mais atingido por esse tipo de desastre, com um registro de seis ocorrências. (MI, 2012) A área de estudo, apresenta características físicas e geográficas propícias para o aumento da intensidade da erosão fluvial, pois sua localização é área de influência de

67

processos costeiros. Sua caracterização geomorfologica contribui para o aumento no número de processos erosivos. Segundo Jungles (2011, p.43) os episódios de erosão fluvial no município são recorrentes. O município de Augusto Corrêa efetuou seis registros, sendo o município do litoral paraense mais atingido. Os episódios no município são recorrentes em algumas áreas como Perimirim e Coroa Comprida, que apresentam apresenta solo arenoso propício à erosão. Diversos outros fatores influenciam no processo de erosão na ilha em questão: a ação do mar, os fortes ventos, e as fortes chuvas (Mapa 4). A imagem seguinte nos mostra os municípios atingidos no período de vinte anos e identifica o município em questão com o maior número de ocorrências e, em particular, com duas ocorrências em 2007 e uma no ano de 2010, que culminou no decreto de situação de emergência (Tabela 3).

Tabela 3 - Municípios atingidos por erosão fluvial no estado do Pará, período de 1991 a 2010.

Fonte: Jungles (2011).

68

Mapa 4 - Adaptado de desastres naturais causados por erosão fluvial e movimento de massa no estado do Pará, período de 1991 a 2010.

Fonte: Jungles (2011).

69

A ocorrência de desastre no ano de 2010 ocasionou o preenchimento do Formulário de Avaliação de Danos que apresenta os seguintes dados, os dados de danos humanos auferidos são: 685 pessoas afetadas, 31 desalojadas, 13 desabrigadas, 52 deslocadas. Com relação aos danos materiais, houve a danificação de 15 residências populares, e a destruição de 5 residências e o posto de saúde da vila de Perimirim. O que ocasionou ao aumento na demanda de atendimentos no posto de saúde existente na sede do município, para atender a população de Coroa Comprida. (MI, 2012) Vale ressaltar, que constatamos em campo a recorrência do desastre, sendo aqui apresentada por duas imagens fotográficas obtidas no mesmo ano, contudo em meses diferentes, uma no mês de janeiro e a outra no mês de novembro. A primeira (Imagem 10) possui registro em janeiro de 2011, e evidencia uma área erodida há algum tempo atrás, e com um volume mínimo de água. Na referida imagem podemos notar há existência de duas arvores arrancadas com a raiz pela maré. O que evidencia o discurso dos moradores sobre a destruição dos recursos naturais e dos ecossistemas ali presentes. A segunda (Imagem 11) foi registrada em novembro de 2011, em outra área no território da praia. Com um significativo volume de água, comprova que havia sido formada recentemente, a área erodida é chamada pelos moradores da praia de “grota”. Os recorrentes processos de erosão ocorridos na ilha ocasiona a mobilidade das edificações e casas existentes na praia, área onde os moradores preferem para construir suas casas.

Imagem 10 - Erosão fluvial no mês de janeiro de 2011.

Fonte: Pinheiro (2011).

70

Imagem 11 - Erosão fluvial no mês de novembro de 2011.

Fonte: Bentes (2011).

4.3. DESCRIÇÃO DO FENÔMENO A PARTIR DO PONTO DE VISTA DO PODER PÚBLICO.

Em 2010, o prefeito da cidade de Augusto Corrêa, Amós Bezerra decretou situação de emergência. Mendes (2010): No ultimo dia 7, o prefeito do município, Amós Bezerra, decretou situação de emergência em Coroa Comprida por um prazo de 180 dias. Justamente no período invernoso, quando as águas são mais fortes e é mais intensa a devastação da praia onde foram erguidos os barracos dos pescadores. Amós informou que 21 famílias já estão desabrigadas, pois seus barracos foram destruídos pelas águas, e vivem hoje na área urbana do município, em casas de parentes e amigos, todas aguardando um destino melhor.

De acordo com Jungles (2011), foram registradas seis ocorrências de erosão fluvial no período entre os anos de 2002 a 2010, no município de Augusto Corrêa sendo que no ano de 2007 foram dois registros. Considerando essas ocorrências como anormais, e gerando danos e prejuízos à população afetada, o Poder Público local percebe-se frente à situação de desastre natural, não somente em nossa área de estudo, mas também em outras áreas do território municipal. Segundo o Ministério de Integração Nacional (MI), o órgão responsável por desastres provocados por causas naturais e/ou antropogênicas é a Defesa Civil. Para atingir seus objetivos, ou seja, reduzir os desastres, e minimizar seus danos, ao referido órgão cabem as seguintes ações: prevenção, redução e reconstrução em situações emergenciais e sobre

71

desastres, MI (2012). Contudo, para atender a demanda o órgão responsável necessita em alguns casos de auxilio de outros órgãos, podendo contar como o Corpo de Bombeiros e as Forças Armadas. O que explica, o discurso de Valencio et al. (2009, p.71) “A Defesa Civil, assim como o Corpo de Bombeiros, são os braços do Estado no provimento de segurança quando os limites parecem prestes a ruir”. A formalização de ocorrência de um desastre se dá pela emissão do Formulário de Notificação Preliminar de Desastre (NOPRED) e/ou o Formulário de Avaliação de Danos (AVADAN). Um desses documentos é preenchido por um membro da Defesa Civil do município, que o envia para a Coordenadoria Estadual da Defesa Civil e esta para a Secretaria Nacional de Defesa Civil. Em sequência, o desastre é homologado e reconhecido através de decreto de Situação de Emergência ou de Calamidade Pública no Diário Oficial da União (JUNGLES, 2011, MI, 2012). Para a decretação de uma Situação de Emergência / Estado de Calamidade Pública os gestores municipais precisam conhecer no mínimo três conceitos utilizados pela Defesa Civil, descritos a seguir, segundo o Ministério da Integração:

Desastre: resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem sobre um ecossistema vulnerável, causando grave perturbação no funcionamento de uma comunidade ou sociedade, envolvendo extensivas perdas e danos humanos, sociais, econômicos ou ambientais, que excede a sua capacidade de lidar com o problema usando recursos próprios; Situação de emergência: situação anormal, decretada em razão de desastre, que embora não excedendo a capacidade inicial de resposta do município ou do estado atingido, requer auxílio complementar do Estado ou da União para as ações de socorro e de recuperação; Estado de Calamidade Pública: situação anormal em razão de desastre, que em razão da magnitude dos danos, requer auxílio direto e imediato do Estado ou da União para as ações de recuperação. (MI, 2012, documento não paginado).

A medida inicial tomada pelo Poder Público local frente à situação de desastre foi à decretação de situação de emergência. Os dois últimos decretos foram: 

Decreto nº 763, de 11 de janeiro de 2008, homologado e reconhecido pelo Decreto Nº 126/2007, que “Dispõe sobre a situação de emergência em que se encontra a orla marítima da Vila de Perimirim no município de Augusto Corrêa e dá outras providências”;



Decreto n° 2.181, de 15 de março de 2010, homologado e reconhecido pelo decreto n°004 de 07 de janeiro de 2010, que “Dispõe sobre a situação

72

de emergência nas localidades de Coroa Comprida e Perimirim no Município de Augusto Corrêa e dá outras providencias”.

Durante a execução desse trabalho, pudemos analisar o arcabouço legal pertinente ao tema, o que nos levou a perceber que apesar da existência de legislações capazes de resguardar o direito dessas vítimas, de uma maneira geral, os responsáveis pela execução dessas leis encontram dificuldades no cumprimento das mesmas. Assim, os moradores que se percebiam em situação de risco e vivenciando o desastre se deslocaram com seus próprios recursos para casas de parentes e amigos em outros locais do município. Essa dificuldade no cumprimento das leis parece ter colaborado para protelar a saída dos últimos moradores da ilha. Recentemente, foi criada a lei nº 12.340, de 1º de dezembro de 2010, que regulamenta as ações para recuperação de áreas atingidas por desastres e dispõe sobre o reconhecimento da situação pelo Poder Executivo Federal: Dispõe sobre as transferências de recursos da União aos órgãos e entidades dos Estados, Distrito Federal e Municípios para a execução de ações de resposta e recuperação nas áreas atingidas por desastre, e sobre o Fundo Especial para Calamidades Públicas; e dá outras providências. Art. 3o O Poder Executivo federal apoiará, de forma complementar, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios em situação de emergência ou estado de calamidade pública, por meio dos mecanismos previstos nesta Lei. § 1o O apoio previsto no caput será prestado aos entes que tiverem a situação de emergência ou estado de calamidade pública reconhecidos pelo Poder Executivo federal. § 2o O reconhecimento previsto no § 1o dar-se-á mediante requerimento do Poder Executivo do Estado, do Distrito Federal ou do Município afetado pelo desastre.

Com base no Diário Oficial da União do dia 16 de março de 2010, o desastre ocorrido na Ilha da Coroa Comprida teve seu reconhecimento junto ao Poder Executivo Federal através Decreto N°004 de 07 de janeiro de 2010. Art. 1°- Fica declarada a situação de emergência nas localidades de Coroa Comprida e Perimirim, Município de Augusto Corrêa, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias. Art. 2° - Os serviços públicos municipais serão direcionados para a resolução das situações surgidas em decorrência da erosão fluvial e fortes chuvas nas localidades. Art. 3 °- Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação

Com o decreto homologado, o gestor público pode tomar algumas medidas, como: doação de cestas básicas, colchões, telhas entre outras medidas. Tais medidas nos foram relatadas pelo atual prefeito, por algumas pessoas atingidas e beneficiadas, e pelo presidente

73

da Colônia de Pescadores. Com ressalva de que nem todas as pessoas afetadas tiveram acesso a recursos. No corrente ano, o atendimento às vítimas de desastre foi contemplado através da lei nº 12.608, de 10 de abril de 2012: Regulamenta a Medida Provisória No 494 de 2 de julho de 2010, para dispor sobre o Sistema Nacional de Defesa Civil - SINDEC, sobre o reconhecimento de situação de emergência e estado de calamidade pública, sobre as transferências de recursos para ações de socorro, assistência às vítimas, restabelecimento de serviços essenciais e reconstrução nas áreas atingidas por desastre, e dá outras providências.

Dentre outros de seus artigos, esta lei dispõe em seu Art. 3º- B sobre a ocupação de áreas de riscos, e sobre remoção e realocação das populações atingidas: Verificada a existência de ocupações em áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos, o município adotará as providências para redução do risco, dentre as quais, a execução de plano de contingência e de obras de segurança e, quando necessário, a remoção de edificações e o reassentamento dos ocupantes em local seguro. § 1o A efetivação da remoção somente se dará mediante a prévia observância dos seguintes procedimentos: I - realização de vistoria no local e elaboração de laudo técnico que demonstre os riscos da ocupação para a integridade física dos ocupantes ou de terceiros; e II - notificação da remoção aos ocupantes acompanhada de cópia do laudo técnico e, quando for o caso, de informações sobre as alternativas oferecidas pelo poder público para assegurar seu direito à moradia. § 2o Na hipótese de remoção de edificações, deverão ser adotadas medidas que impeçam a reocupação da área. § 3o Aqueles que tiverem suas moradias removidas deverão ser abrigados, quando necessário, e cadastrados pelo Município para garantia de atendimento habitacional em caráter definitivo, de acordo com os critérios dos programas públicos de habitação de interesse social”

No primeiro contato com um representante do poder local, obtivemos importantes informações sobre o atual destino dos deslocados. O diretor de departamento da Secretaria Municipal de Obras e Serviços Urbanos/ SEMOB, nos informou o que estava acontecendo na ilha: “tá ocorrendo um fenômeno natural na ilha e por isso os moradores tiveram que ser remanejados para outros locais do município, devido ao risco que os moradores têm vivido. Estão sendo construídas vinte e cinco casas em um bairro próximo daqui”. Ele ainda nos confirmou: “que o órgão responsável pelo deslocamento dos moradores da ilha era a Defesa Civil, e as assistentes sociais da Secretaria de Trabalho, eles podem te dar mais informações”. (diretor de departamento da Secretaria Municipal de Obras e

74

Serviços Urbanos). Muito prestativo e solícito, ele ainda nos disponibilizou duas viaturas da prefeitura tipo motos para nos levar ao local onde estavam sendo construídas as casas, no Bairro cujo nome nos foi apresentado em um primeiro momento como “Mirrelle”. Em momento posterior constatamos que os moradores passaram a denominá-lo bairro “Bom Jesus”, isto é, o mesmo nome do bairro ocupado e criado por eles mesmos. (Imagem 12). Imagem 12 - Casas destinadas a 25 famílias em construção no Bairro Bom Jesus antigo Mirreli.

Fonte: Bentes (2011).

Na Secretaria Municipal de Trabalho, Economia e Promoção Social (SEMTEPS), a Assistente Social prestou a seguinte informação: “No ano de 2010 representantes da Defesa Civil juntamente com mais duas assistentes sociais do SEMTEPS, estiveram na ilha da Coroa Comprida para coleta de dados e informações sobre a quantidade de famílias e moradores ainda existentes na ilha. Após essa visita foi determinada a construção de 25 casas, em um bairro localizado as proximidades da sede administrativa. Cujo órgão responsável, para a escolha do território e para a construção das casas, é a Prefeitura do município.” (Assistente Social da SEMTEPS, 2011).

Segundo informações da assistente social, o intuito dos representantes do SEMTEPS e da Defesa Civil, era levantar dados sobre a população que ainda permanecia na ilha, para fazer o cadastro dessas pessoas, para garantia de atendimento habitacional, conforme instituído na lei nº 12.608, de 10 de abril de 2012, Art. 3º- B, § 3o, que versa sobre a garantia de habitação para os que perderam suas moradias e estão desabrigados. Contudo, apesar, do direito a habitação esta instituído em lei, percebemos no presente estudo de caso uma dificuldade na garantia dos direitos da população afetada.

75

Na entrevista com o Prefeito do município, entendemos que o mesmo como gestor público, está ciente de todo o contexto vivido em Coroa Comprida pelos moradores envolvidos, e conhece em os motivos que o levaram a decretar a situação de emergência. O mesmo garante tomar todas as medidas cabíveis para o atendimento e proteção dos envolvidos, contudo assinala que há certa resistência de saída dos moradores da ilha, graças a seu modo de vida familiarizado com o mar. Podemos observar em todas as entrevistas o mesmo discurso sobre a atual situação ambiental da ilha: “é um fenômeno natural”. Para as pessoas entrevistadas, o desastre é tratado como fenômeno normal, típico daquele ambiente, embora demonstrem preocupações significativas para a retirada dos moradores que permanecem na ilha. Todavia, não se trata de uma medida ampla nem de uma política pública para o município. Trata-se de uma medida pontual, que se realiza lentamente e atende apenas a uma pequena parcela da população atingida.

4.4

DESCRIÇÃO DO FENÔMENO DO PONTO DE VISTA DOS MORADORES DA

ILHA. “Na situação de desastre, ocorre com a população afetada um desarranjo parcial ou total de seus lugares habitacionais de vivência, assim como perda das fontes de trabalho e da rede social de apoio.” Valencio et al. (2009, p. 69), o contexto encontrado na ilha, evidencia a afirmação descrita anteriormente, comprovamos o deslocamento compulsório da população afetada em busca de sobrevivência. Os dados coletados no Ministério da Integração, nas entrevistas nos depoimentos, nas conversas informais nos revelam à existência das categorias: desalojados e desabrigados decorrente do desastre ocorrido na ilha. A situação de desastre acarretou na danificação ou destruição de suas moradias (chamadas por eles de casa e/ou rancho) que servia para eles de abrigo, inutilizando alguns de seus bens permanentes (colchão, fogão, geladeira, televisão), e acarretando ainda em danos imateriais levando os mesmos ao processo de desterritorialização. O que é confirmado no que diz Valencio et al. (2009,p.53) Assim, em um desastre, desalojados e desabrigados têm o par família-casa, como elementos de construção da realidade social, dissociado em razão da moradia estar destruída ou danificada ou em área considerada de risco. Torna-se inviabilizado, por questões ditas de “segurança”, o modo como às famílias reproduziam-se na casa, “no seu fazer algo”, “por ou com alguém”, “em algum lugar do lar”. Isto é, com a desterritorialização, elas precisam tentar recriar as práticas associadas ao mundo privado da casa num outro território forjado pelos órgãos públicos para a suposta segurança das mesmas: os abrigos temporários.

76

A situação de desastre confirmou muitos a situação de desalojados ou desabrigados, contudo, o deslocamento compulsório dessas famílias ocorreu a longo prazo e em momentos distintos, sendo contabilizados somente os descritos no relatório de Avaliação de Danos quando o desastre pode ser classificado a uma intensidade de nível alto. A insistência em permanecer na ilha e a situação por eles vivida, demonstram a importância do território em questão para essas pessoas. No discurso dos entrevistados notamos que por vários anos conviveram com a situação de risco decorrente ao processo de erosão fluvial ser recorrente. Contendo como fundo o processo de desastre, os moradores da ilha desenvolveram um glossário específico de palavras para tratar o desastre da erosão fluvial (cuja causa do desastre é o fenômeno de Terras Caídas, onde a água atuando nas margens do rio em terreno sedimentar de natureza arenosa provoca um trabalho subterrâneo de erosão). Eles demonstram que adquiriram profundo conhecimento na vivencia dos recorrentes processos de desastre, não apenas sobre os acontecimentos, mas também sobre as medidas para amenizá-los. Percebe-se a relevância do saber local para escolher novos locais, identificar os mais perigosos e, sobretudo para revelar a diminuição do território que poderia ser habitado por eles. Especialmente o conhecimento agregado sobre a erosão fluvial, que os proporcionou permanecer mais tempo na ilha, uma vez que os mesmos com o conhecimento popular protegiam principalmente os poços de água ainda existentes na ilha, para atender a demanda de suas necessidades básicas relacionados à sobrevivência. O conhecimento local sobre a situação de desastre se estabeleceu com o intuito de “garantir” mesmo que temporariamente a permanência dos mesmos na ilha, os mesmos desenvolveram então, um glossário específico com palavras para tratar as etapas do desastre: esbandalhar; banzeiro; grota; ventos do Norte; correnteza e barreira são os principais vocábulos utilizados na explicação.

Esbandalhar

Nas entrevistas e conversas feitas com moradores e com a população já deslocada, percebemos que uma das palavras mais utilizadas é “esbandalhar”: que para eles significa dizer que a ilha esta sendo destruída, e essa destruição é causada pelas marés. No Dicionário da Língua Portuguesa (Aurélio), esbandalhar significa fazer em pedaços; despedaçar, destruir; desbaratar.

77

Os moradores da ilha afirmam que a maré é a responsável não só pela destruição da praia, mas também de suas casas e dos ecossistemas da ilha. Nos relatos comprovamos que até as instalações que prestam serviços públicos foram destruídas pela maré. Seu José conta que há anos a ilha tinha um extenso território com várias casas e coqueiros. A vila era formada por quatro ruas de casas e a prefeitura do município mandou construir um grande colégio que juntamente com as casas foi destruída pela maré: “Quando vinha pra esbandalhar num tinha jeito, a maresia quebrava, lá vinha, a água dava pancada nas casas aqui, tinha vez que a gente andava de casco dentro da praia. O colégio que foi construído aqui não aguentou uma semana” (Seu José, agosto de 2011). “A ilha não esbandalha de uma vez, esbandalha pouco a pouco, cada ano esbandalha um pedaço. E agora não tem mais jeito. Eles vieram pra cá [Bairro Bom Jesus] sozinhos, não tiveram ajuda da prefeitura não. Tiveram ajuda de Deus.” (Seu Daniel, novembro de 2012). Seu Daniel falava dos moradores que mudaram da ilha há três anos sem ajuda da prefeitura, contando com o apoio de amigos e parentes. O desastre dentre outras consequências, acarretava na mobilidade não só da população, mais também de suas casas e das outras instalações, como o colégio e o posto de saúde. Logo após o período de ocorrência do desastre as famílias que não resolviam abandonar a ilha, coletavam os materiais que sobravam da destruição, como telhas e madeira e reconstruíam novas casas em um local aparentemente mais seguro em outro local ainda dentro da praia. “A maré já esbandalhou nossa casa. Nossa casa era muito longe daqui, agente num enxergava nem a beira da maré. Nos já passamos 15 dias no colégio [abrigo provisório] foi quando a maré esbandalhou nossa casa. Aí nos tivemos que vir pra cá, tem outros morando aqui, uns porque não querem sair porque estão acostumados aqui e outros esperando solução.” (Dona Maria, agosto de 2011). “Nasci e me criei na Coroa Comprida tenho 46 anos, e não gostaria de deixar de morar lá, só saí por causa do efeito das marés, que esbandalhou os barracos. Eu sou pescador orgulhoso, pra mim não tem outro ramo que seja melhor do que a pesca.” (Seu Manoel, junho de 2012). Os moradores da ilha mantinham uma relação de dependência com os ecossistemas existentes na praia e dependiam da pesca para sua reprodução social e subsistência por esse motivo não pretendiam sair da ilha:

78

Têm 15 famílias aqui [na ilha], o resto já foi embora pra Augusto Correa, as casas vão esbandalhando eles [os moradores] vão indo embora. Morar em casa alugada, de casa de parente. Os pescadores [que já deixaram a ilha] vêm de lá de Augusto Corrêa pra trabalhar aqui. Quem vive na praia a vida é essa. A vida é assim. O importante é pescar pra ir pra lá [pra sede do município] agente vai, pra vir pra cá [voltar pra ilha] é ruim. (Dona Maria, agosto de 2011). “Ah! Eu moro aqui há uns quarenta e dois anos, essa é minha filha nasceu aqui, meus filhos mesmos todos são dez e estão todos vivos. To esperando uma casa que ta saindo pra lá. Eu to por aqui que eu gosto de tá aqui na praia, porque eu gosto de ta pescando, pegando camarão.” (Dona Joana, agosto de 2011). Banzeiro Outra palavra muito utilizada pelos moradores é “Banzeiro”, utilizada para designar onda grande, e que ajuda a destruir a praia. Quando perguntei o que era onda grande, recebi a resposta em coro: “Banzeiro é a onda grande, é o que destrói a praia junto com essa grota” (Dona Joana, Dona Maria, Seu José, agosto de 2011). De certo modo, o sentido também se assemelha ao constante do Dicionário, que o traduz como “sucessão de ondas provocadas pela pororoca ou por uma embarcação a vapor no rio”. “Quando o banzeiro veio que ele deu, a onda grande e a maresia muito alta, ninguém tem coragem de entrar pra tirar nada por causa da correnteza. Forma a barreira, uma barreirona.” (Dona Dona Maria agosto de 2011). “E teve muita onda, quando veio o banzeiro que não teve nem condições de ninguém tirar nada e as pessoas perderam tudo, as coisas vão parar lá no mangal.” (Seu José, agosto de 2011). Grota

É o vocábulo utilizado para designar a fenda que se abre na praia e é ocupada ou destruída pela água. Mesmo não havendo mais água, a grota fica fofa e naquele local não pode mais haver construção: Toda chuva que dá abre “grota”, é um córrego que abre e fica cheio, cheio de água. No Dicionário da Língua Portuguesa (Aurélio), fenda que as águas da enchente fazem na ribanceira de um rio.

79

Nesse momento, os moradores nos levaram até uma erosão ou grota que se encontrava presente na praia, e cheia de água (Dona Joana, Dona Maria, Seu José, agosto de 2011). “Grota é o igarapé que faz, e vai cada vez mais se abrindo quando chove e vai se movendo a terra eu queria que a senhora visse que vai sumindo tudo dentro.” Analisando alguns trechos das conversas podemos perceber que eles possuem nomes próprios para cada momento do fenômeno, inclusive para o movimento dos ventos que é a corrente de vento que vem do Oceano Atlântico, chamado de “ventos do norte” – que potencializa cada vez mais o processo de destruição da praia. A defesa civil veio, conversou, filmou tudo e disseram que eles iam dar as casas pra nós. Eles vieram em dois períodos chuvosos e viram mesmo o que estava acontecendo, viram o banzeiro e a grota. Vem de frente, vem destruindo tudo. Aí se junta com o “vento norte”, e vem esbandalhando tudo porque é muito forte. (Dona Maria, agosto de 2011).

Barreira Outras palavras utilizadas são: “forte correnteza” e “formação de barreira”, que estão relacionadas com os processos de cheia da maré. A formação de barreira é uma declinação no terreno, que faz com que as casas fiquem mais próximas da invasão das marés. E quando o banzeiro veio que ele deu, é a onda grande e a maresia muito alta, ninguém tem coragem de entrar pra tirar nada por causa da correnteza. Forma a barreira, uma barreirona. (Seu José, agosto de 2011). Olha a moça aí, a barreira tá bem pertinho da casa dela, e a cada maré que cresce ela vai ter que ir se arredando mais, né. Ela vai ter que tirar essa casa daí. (Dona Maria, agosto de 2011).

Ribanceira

Diferentemente do dicionário da Língua Portuguesa (Aurélio) que define ribanceira como “margem elevada de um rio ou de um lago”, os moradores denominam ribanceira uma medida de proteção para proteger o poço que fornece água para a ilha. Que é “ribanceira”? - “botava areia, mato, pau, e nós cercávamos o poço. Isso é ribanceira que a gente chama prá não invadir o poço. Pra não invadir prá

80

gente tomar água, era muita gente era os pessoal todinho fazendo serviço.” (Seu José, agosto de 2011). Percebemos que os moradores adquiriram um conhecimento muito sofisticado a respeito dos processos erosivos que foram e ainda estão sendo vividos por eles, sabendo mesmo identificar o fenômeno a partir do movimento das marés e dos ventos e reconhecendo esse processo como sendo muito violento para suas vidas e dos ecossistemas. Nos relatos confirma-se também uma das piores consequências da erosão que é a perda dos solos, localmente denominada diminuição da praia. Fato que motiva o deslocamento no interior da ilha até que este se torna inviável e força o deslocamento para outras ilhas ou para a periferia da sede do município. Vale ressaltar, que chuva agrava o desastre e a situaçao vivida. “Toda chuva que da abre grota, é um córrego que abre cheiao de água.” (Dona Maria, agosto de 2011). Nesse contexto, podemos dizer que tantao para a população deslocada e como também para que ainda permanece na ilha, o erosão fluvial é considerada um fenômeno da natureza, ou seja, ocasionado pelas marés. Contudo, os mesmos consideram-se vítimas desse processo, e aguardam solução e assistência do poder público local.

4.5. ANÁLISE TEMPORAL DAS IMAGENS DE SATÉLITE - ILHA DA COROA COMPRIDA

O processo de erosão fluvial, segundo a mídia e os moradores locais, ocasionou diversas consequências, dentre as quais a diminuição do território da praia. Com a intenção de observar essa possível redução da praia, foram utilizadas imagens do Satélite Landsat 5. As imagens escolhidas foram dos anos de 1986 e 2011, por possuírem as melhores definições, apresentarem em sua composição poucas nuvens, facilitando assim a análise. As imagens temáticas (Imagem 13) são de agosto de 1986 (à esquerda) e agosto de 2011(à direita). Nesta composição temática temos vegetação em verde, áreas urbanas ou de terra aberta em amarelo / marrom, e praias em branco (assim como nuvens). Neste intervalo de 25 anos temos uma grande variação na geografia da região. De maneira geral, vemos o surgimento de ilhas (na ponta sudoeste e ao leste da ilha), uma expansão da Ilha da Coroa Comprida na sua região média assim como o surgimento de terra na ponta Nordeste da ilha.

81

Observe, porém, que na região de interesse - a praia da Coroa Comprida, na ponta noroeste da ilha – vê-se uma clara diminuição da área de praia - o que confirma os relatos dos moradores. De acordo com os dados das entrevistas feitas na ilha, durante anos os moradores viveram na área de praia, tendo que se mudar toda vez que a “maré esbandalhava” suas casas, o que demonstra uma mobilidade interna na extensão de praia durante anos e que protelou por décadas a saída dos moradores. Contudo, a atual situação de configuração física da ilha não permite mais essa mobilidade, uma vez que a permanência dos mesmos na área encontra fortes dificuldades, entre essas podemos citar como exemplo, no período de maré cheia, a invasão da água do mar a praia atingindo as casas existentes na região. Outra dificuldade enfrentada pelos mesmos é devido à salinização dos poços, também decorrente da invasão da água do mar. Afim, de demonstrar a mobilidade interna causada pela erosão, trabalhamos de forma comparativa duas imagens obtidas através do programa GoogleEarth da Ilha da Coroa Comprida, fazendo um recorte limitado da região de praia da Coroa Comprida. Imagem de março de 2007 à esquerda (Imagem 14). E de Julho de 2011 à direita (Imagem 15), ambas na mesma escala (não mencionada pelo programa GoogleEarth mas a mesma indicada pela “altitude de visada'” de 3668 ft. para ambas) Notamos que em 2007 temos visivelmente uma comunidade na parte inferior (sul) da imagem adjacente a uma praia. A mesma região em 2011 foi substituída por uma área verde e todas as construções aparentam terem-se mudado para a área mais ao norte. Isto consistente com a mobilidade da comunidade na ilha e com o reaproveitamento dos materiais de construção. Observamos também que a extensa praia da Coroa Comprida fica reduzida a uma estreita tira de terra próxima ao manguezal. Também vemos uma clara redução na área norte da praia. Aqui temos uma clara evidência que no espaço de tempo de quatro anos, entre 2007 e 2011, houve uma redução drástica na área da praia, inviabilizando a permanência na ilha.

82

Imagem 13 - Imagens da ilha da Coroa Comprida Satélite Landsat 5

Fonte: Landsat5 - obtido livremente pela USGS. Composição temática - canais 5, 4, e 3. Imagem composta e produzida por Dr. Breno Imbiriba - NUMA/UFPA - 2012.

83

Imagem 14 - Recorte de Imagem da ilha da Coroa Comprida ano 2007.

Fonte: Imagem Truecolor Googleearth (Google 2012, Teleatlas 2012).

Imagem 15 - Recorte de Imagem da ilha da Coroa Comprida ano 2011.

Fonte: Imagem Truecolor Googleearth (Google 2012, Teleatlas 2012).

84

CAPÍTULO V – AS SOLUÇÕES 5.1 AS SOLUÇÕES DOS PRÓPRIOS MORADORES 5.1.1. O deslocamento Em conversas com moradores já deslocados, notamos uma espécie de insatisfação sobre as medidas tomadas pelos gestores governamentais (especialmente em nível municipal) e um sentimento de antipatia pela Defesa Civil que, após uma visita de seus representantes e assistente sociais do SEMTEPS, determinou juntamente com a prefeitura do município a construção de somente vinte e cinco casas para as famílias que ainda permaneciam morando na ilha. Verificamos que os moradores estão tendo apoio somente das representações públicas locais. E não contam com o auxilio de nenhuma outra organização, como Organizações não governamentais (ONGs) ou outras organizações ligadas à questão socioambiental. O modo e o ritmo das ações do poder público local têm protelado a retirada do número total de moradores da ilha, que permanecem em situação de risco. Ainda segundo relato dos moradores, o deslocamento da maioria das famílias habitantes da ilha foi de maneira desorganizada e individualizada. As famílias, por conta própria, resolveram abandonar suas casas com medo e insegurança, não suportando mais viver com o risco de erosão da praia. O deslocamento compulsório se deu de acordo com a disponibilidade dos recursos financeiros e com a rede de relações sociais de cada família. Assim, deslocaram-se para regiões diversas: outras ilhas do arquipélago, suscetíveis de desastres similares; casas de parentes e familiares que residem na zona urbana de Augusto Corrêa; e 15 famílias ainda permanecem na ilha. Os primeiros moradores deslocaram-se com seus próprios recursos para a vila de Perimirim, onde habitam até hoje (Imagem 16 e 17). Conforme Rosa (2007), essa vila foi criada para abrigar os moradores da Coroa Comprida, a partir do início de seu desaparecimento há aproximadamente 36 anos. Contudo, essa vila também tem sofrido com o processo erosivo causando a mobilidade de casas e construções para partes internas do território da vila. A escolha de Perimirim ou de outras ilhas do arquipélago como seu novo local de moradia é motivada pela proximidade do mar, isto é, pela possibilidade de manter condições

85

similares de produção econômica (a pesca) e de reprodução social (a comunidade de pescadores). Imagem16 - Características da Vila de Perimirim

Fonte: Bentes (2012)

Imagem 17 - Processo de erosão na Vila de Perimirim

Fonte: Bentes (2012)

Outra parcela dos moradores mudou para o Bairro Bom Jesus (Imagem 18), considerado por Pinheiro (2011) como uma área de invasão, situada próxima à sede administrativa. Conforme o atual Presidente da Colônia dos Pescadores, “um morador comprou um terreno, e dividiu com os outros moradores, e assim eles foram se mudando”. Com o apoio do Presidente da Colônia, fizemos uma visita ao local, onde pudemos constatar a situação que vivenciam os moradores. Todavia, segundo relato dos moradores a escolha por este bairro se deve à proximidade de um acesso ao rio Urumajó. (Imagem 19). O que podemos perceber é que mesmo para aqueles que atualmente moram no bairro Bom Jesus, a construção de suas identidades e sua reprodução social se dão através de sua relação de trabalho: a pesca. Essa é a atividade que garante a alimentação familiar a custos pequenos e dessa forma proporciona condições necessárias para a reprodução social dos mesmos. “Por que o trabalho daqui da gente é pesca, nos se mantém com a pesca. Eu pesco de todo jeito, até pra fora eu vou. O bom de ir pra lá (para o bairro Bom Jesus) é por causa dos estudos dos filhos, que precisam estudar, e não tem aqui” (Dona Maria, agosto de 2011).

86 Imagem 18 – Casas do Bairro Bom Jesus às proximidades da sede administrativa

Fonte : Bentes (2011).

Imagem 19 – Pequeno porto próximo às casas do Bairro Bom Jesus

Fonte : Bentes (2011).

No bairro Bom Jesus (antigo Mirrelli), não há transporte público e o mesmo é afastado da sede administrativa. Para lá, foram deslocadas dez famílias. Em junho de 2012, as casas não haviam sido finalizadas (Imagem 20), e o prefeito nos informou que “como ainda não saiu à segunda parcela do recurso financeiro destinado para a construção das casas, conseguimos somente telhar e colocar portas e janelas de 10 casas, assim consegui transferir dez famílias da ilha”. (Imagem 21). Conforme pode ser observado nas imagens, não há saneamento básico e os próprios deslocados construíam uma fossa atrás da casa (Imagem 22). A energia elétrica foi “puxada” da casa de uma senhora que mora lá perto. E os mesmos construíram um poço na frente das casas (Imagem 23), para suprir a necessidades de todos deslocados da ilha.

Imagem 20 – Construção casas: Bom Jesus.

Imagem 21 – Casas ocupadas.

Fonte: Bentes (2012)

Fonte: Bentes (2012)

87 Imagem 22 – Escavação de fossa seca.

Fonte: Bentes (2012).

Imagem 23 – Construção de poço aberto.

Fonte: Bentes (2012)

O prefeito não estipulou um prazo determinado para a finalização das casas. É importante enfatizar a potencial impossibilidade de retorno ao habitat tradicional dos deslocados em questão, uma vez que essas pessoas não poderão retornar face a destruição completa de algumas casas; o estado instável de segurança que se encontra a ilha; a falta de água potável, pois, de acordo com relatos de moradores nenhum dos poços que abastecia a ilha fornece mais água potável. Apesar disso, os antigos moradores da ilha ainda frequentam a mesma, para exercer a pescaria, e por considerarem ainda o local como seu habitat. Os mesmos se deslocam de seu atual local de moradia até a ilha e permanecem em ranchos até acabar a pesca, depois desse período retornam para suas casas atuais, contudo os mesmos alegam que “nunca deixaram de ir à ilha”. Para mostrar o destino atual dos deslocados de Coroa Comprida, elaboramos um mapa do deslocamento que nos indica de onde os moradores saíram e para onde eles foram compulsoriamente deslocados. Esse procedimento foi possível, através da coleta de pontos com um aparelho de Global Positioning System (GPS) (Mapa 5).

88 Mapa 5 - Mapa de deslocamento interno de moradores da ilha da Coroa Comprida

Fonte: Dados de Pesquisa de Campo (2012)

89

5.2 AS SOLUÇÕES DO PODER PÚBLICO A solução inicial do poder público local foi o atendimento emergencial. Foram doados os seguintes produtos: cestas de alimentos, kits de limpeza, telhas e tijolos. A preocupação era atender o mais rápido possível a população em questão e suas necessidades básicas. Posteriormente ao desastre, o poder público local decidiu retirar todas as famílias da ilha, uma vez que o processo de erosão fluvial tem se agravado com as cheias das marés e o período de inverno. Para atingir tal objetivo o prefeito decretou situação de emergência, a fim de assim conseguir assistência da Defesa Civil com medidas de proteção e recursos financeiros extra orçamento municipal para atender à situação emergencial. Os moradores passaram então a ser deslocados, alguns deles, com o apoio da prefeitura para casas de parentes e amigos dentro do município. Com este apoio, conforme dissemos grande parte das famílias passou a residir numa área de invasão próximo a sede administrativa. Outra parcela da população mora em outras ilhas do arquipélago, principalmente na Vila de Perimirim. A proposta apresentada pelo governo local é a transferência dos que permanecem na ilha, devendo construir algumas casas para abrigar o resto da população. Tomada à decisão do deslocamento, foram feitas algumas reuniões com os moradores e o Prefeito do município, a fim de determinar qual local seria escolhido para construção das vinte e cinco casas determinadas pela Defesa Civil. O bairro escolhido para a construção das casas era chamado inicialmente de Mirrelle e posteriormente passou a ser chamado de “Bom Jesus”, mesmo nome de outro bairro que mora parte da população. Segundo informações do Secretario de Administração e Finanças: “eles não gostavam do nome Mirrelle e decidiram trocar o nome do bairro para Bom Jesus”. Ainda de acordo com o Secretário, “a construção das casas ainda não terminou, pois não houve o repasse da segunda parcela do recurso destinado à finalização das casas”. Enquanto as casas não ficam prontas, algumas famílias permanecem na ilha e carecem de assistência. Para atender algumas necessidades básicas como água e o fornecimento de energia, o prefeito disponibilizou um gerador de energia, e o transporte de água potável para ilha, doada por uma fábrica de gelo que funciona no município. Esse abastecimento ocorre duas vezes por semana, sendo o transporte da água feito por um morador da ilha, que diz que a quantidade de água transportada é “480 litros de 3 em 3 dias.”

90

Em nossa última viagem, havia algumas poucas famílias morando na ilha. E dez famílias já haviam sido transferidas para as casas do bairro Bom Jesus, antigo Mirreli. Apesar de ficarmos no local por dois períodos distintos e nos identificarmos como pesquisador, fazendo o uso de ofício da instituição de ensino, na qual temos vínculo como discente (UFPA/NUMA), não obtivemos até o momento um retorno sobre informações mais detalhadas sobre os próximos passos da assistência. O clima de eleição no município tem causado implicitamente um conflito, que tem gerado uma desconfiança da população com seus gestores públicos, pelo não término da construção das casas destinadas ao restante dos moradores da ilha e, sobretudo, pela falta de infraestrutura do bairro Bom Jesus onde já mora uma parcela dos moradores. No contexto atual, os deslocados da ilha da Coroa Comprida se percebem como vitimas de uma situação natural, e consideram o processo por eles vivido como muito violento, que repercute negativamente em seus modos de vida. Por esse motivo, encontramos na região de estudo, um clima de conflito e insatisfação das pessoas envolvidas, que se consideram vítimas e sem assistência. A ocorrência de desastres considerados naturais que provocam o deslocamento compulsório definitivo das populações nesta região é recorrente, destacando-se três regiões dentro da mesma microrregião: o deslocamento populacional de moradores da Praia do Picanço para a Vila do Castelo em decorrência de processo erosivo; o deslocamento de alguns moradores da Praia de Ajuruteua, em decorrência de graves consequências com as águas grandes do mês de março que inundaram parte do povoado e arrastou suas casas (PINHEIRO, 2012); e o caso por nós estudado da ilha da Coroa Comprida.

91

REFLEXÕES CONCLUSIVAS Os dados coletados na formulação da presente dissertação indicam que a erosão hídrica tratada como um fenômeno natural distancia a situação e sua análise das discussões atuais sobre as medidas de prevenção aos riscos ambientais e de proteção social das vítimas dos desastres ambientais. Dessa forma, descaracteriza a natureza política e econômica do desastre ambiental e até descaracteriza o conteúdo político do próprio conceito de “Desastre”: resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem sobre um ecossistema vulnerável, causando grave perturbação no funcionamento de uma comunidade ou sociedade, envolvendo extensivas perdas e danos humanos, sociais, econômicos ou ambientais, que excede a sua capacidade de lidar com o problema usando recursos próprios (DEFESA CIVIL, 2012). Fazendo uma comparação entre alguns conceitos que tratam de transformações ambientais, podemos perceber que, em outros contextos, desde 1985, tenta-se problematizar e politizar as mudanças que ocorrem no meio ambiente e que repercutem sobre a reprodução de modos de vida específicos. Este é o caso, por exemplo, da categoria “refugiado ambiental”, criada para se referir às vítimas de distúrbio ambiental. De acordo com o El-Hinnawi (1985), o distúrbio ambiental caracteriza-se por quaisquer mudanças físicas, químicas e/ou biológicas em um ecossistema, ou na base dos recursos naturais, tornando-o, temporária ou permanentemente, inadequado para o sustento da vida humana. Este autor propõe pela primeira vez o estatuto de refugiado ambiental para as “pessoas que são forçadas a deixar seu habitat tradicional, temporária ou permanentemente, devido a distúrbio ambiental (natural e/ou provocado por pessoas) que colocou em risco sua existência e/ou afetou seriamente a qualidade de vida”. De acordo com Magalhães (2008) o Refugiado é uma categoria jurídica, e o Refugiado Ambiental uma categoria sociopolítica. E o conceito atualmente usado para a categoria política nos transpõe a situação do deslocamento causado aos moradores da Ilha em questão, uma vez que o mesmo é decorrente de grandes transformações físicas ao meio ambiente. É importante ressaltar, que o debate sobre a categoria tem, a longo prazo, ganhado força e argumentos em favor ao reconhecimento de tal situação, o que pode ser evidenciado através da divulgação no site da Agência da ONU para refugiados de dois significativos trabalhos: "Proteger as pessoas deslocadas por razões ambientais - Desenvolver a capacidade de marcos legais e normativos", pesquisa executada pelo professor Roger Zetter, pesquisador

92

sênior e diretor do Centro de Estudos de Refugiados da Universidade de Oxford (Reino Unido) e a pesquisa premiada no “I Concurso Nacional de Estudos Acadêmicos” promovido pelo ACNUR no Brasil e pela Cátedra Sérgio Vieira de Mello (CSVM) “Refugiados Ambientais: Em Busca de Reconhecimento pelo Direito Internacional”, de Erika Ramos, Procuradora Federal da Advocacia-Geral da União em São Paulo e doutora em direito Internacional Público pela USP. Com o decorrer da pesquisa, visualizamos que há uma ligação entre problemas ambientais e processos migratórios na Amazônia. As alterações ambientais enfrentadas são tão relevantes que afetam a vida da população e acarretam o deslocamento de comunidades inteiras como é o caso da Ilha da Coroa Comprida. No caso da Ilha, a população é tratada pelo poder público local como vítima de evento, esporádico e/ou ocasional, classificada como estado de situação de emergência. Trata-se, pois, um fenômeno permanente com medidas e políticas públicas temporárias. O que se pode perceber neste trabalho é que a formulação da política pública guarda estreita correlação com o modo pelo qual o problema é percebido e/ou construído pela população que o vivencia e pelo poder local. No caso de Ilha da Coroa Comprida um fenômeno ambiental de consequências permanentes, que se caracteriza como um desastre socioambiental é vivido pelos moradores e tratado pelo poder local como um fenômeno ocasional e natural. O modo de vida dos deslocados foi e está sendo brutalmente modificado, com repercussões negativas sobre a sua reprodução social, mas as medidas são lentas, parciais e não atendem a toda população atingida. Nesse sentido, vale ressaltar que se faz necessária a implantação e o planejamento efetivo de políticas públicas específicas para as vítimas de catástrofes e/ou desastres ambientais. Contudo, acredita-se não ser suficiente apenas a implantação e o planejamento de políticas públicas, faz-se necessário de acordo com Campanhola e Silva (2000): “saber como estas políticas serão monitoradas e avaliadas” Portanto, tem-se a necessidade de um constante acompanhamento de todos os atores sociais, a fim de analisar o que tem sido feito pela sociedade. Para tal é de extrema importância que haja uma relação de reciprocidade entre o Estado e seus cidadãos, para que assim o “bem comum” seja prioridade e possa ser a meta das políticas públicas. A ocorrência de problemas ambientais como os anteriormente citados, são decorrentes de riscos e problemas que dizem respeito a um determinado ecossistema e que são enfrentados por populações que habitam as zonas costeiras, em especial no Estado do Pará. Ampliando a discussão podemos afirmar que a comunidade de pescadores da ilha da Coroa

93

Comprida, encontra-se exposta a problemas ambientais como: a destruição a longo prazo dos ecossistemas e da biodiversidade encontrada na ilha que acarreta no desaparecimento do território da praia onde habita essa população. Podemos dizer que as ações que foram empreendidas durante o processo de deslocamento compulsório dos moradores de Coroa Comprida, não foram suficientes para a gravidade da situação e as necessidades dos envolvidos, não atingindo a minimização dos efeitos adversos por eles vividos. Apesar de, mesmo como cidadãos os deslocados possuírem direitos assegurados em lei, o poder público local tem encontrado dificuldades em utilizar medidas eficientes, capazes de assegurar a efetividade destes direitos. Por último, cabe acrescentar que este é um problema que repercute sobre toda a população do município, na medida em que o deslocamento massivo acarreta o desencadeamento de outros problemas, como o acréscimo da população urbana do município de Augusto Corrêa, e, consequentemente, a ausência de saneamento básico, a utilização de domicílios insalubres, a poluição atmosférica, o aumento do volume de resíduos, entre outros problemas, que talvez na realidade do município em questão já sejam um verdadeiro desafio para seus gestores.

94

REFERÊNCIAS ACNUR. Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados. Disponível em: < http://www.onu-brasil.org.br/agencias_acnur.php >. Acesso em 23 de maio de 2011.

ACNUR. Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados. Disponível em: < http://www.onu-brasil.org.br/agencias_acnur.php >. Acesso em 23 de maio de 2011.

ARAÚJO, G. R. F. ; SILVA, J. M. P. . Pesca e Mobilidade Populacional em Augusto Corrêa - Pa (1990 - 2008). In: XVI Encontro Nacional dos Geógrafos, 2010, Porto Alegre. Anais do XVI Encontro Nacional dos Geógrafos. São Paulo : agb, 2010.

AREOSA, João. O risco no âmbito da teoria social. In: CONGRESSO PORTUGUÊS DE SOCIOLOGIA — MUNDOS SOCIAIS: SABERES E PRÁTICAS, 4., Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, 2008.

BECK, Ulrich. O que é globalização? Equívocos do globalismo: Respostas à globalização. Tradução de André Carone. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

__________. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. Tradução de Sebastião Nascimento. São Paulo: Editora 34, 2010.

BECK, Ulrich; GILDDENS, Anthony; LASH, Scott. Modernização reflexiva: política, tradicional e estética na ordem social moderna. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1997.

BELEM. Lei Nº 9.474, de 22 de julho de 1997. Disponível em: Acesso em: 20 jul. 2011.

BENTES, Erika Simone da Silva; MAGALHÃES, Sonia Maria Simões Barbosa. Problema ambiental e conhecimento local: a erosão hídrica na ilha da Coroa Comprida, Pará. XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE e PRÉ-ALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012 UFPI, Teresina- PI.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil. Disponível em: < www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm> . Acesso em: 12 jul. 2011.

95

CAMPANHOLA, C; Graziano da SILVA, J. Ações de políticas públicas para o novo rural brasileiro sob o enfoque no desenvolvimento local. Educação (UFSM), Santa Maria, RS, v. III, p. 1-24, 2000.

CASTRO, A. L. C.1998. Glossário de defesa civil: estudo de riscos e medicina de desastres. Brasília: MPO/ Departamento de Defesa Civil. 283 p.

CIDADES. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat. Acesso: 10 abr. 2012.

CIRM, COMISSÃO INTERMINISTERIAL PARA RESURSOS DO MAR. Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro II. Brasília, 1997.

DAGNINO, R. S.; JUNIOR, S. C. Risco Ambiental: Conceitos e Aplicações. Climatologia e Estudos da Paisagem, Rio Claro, v.2, n.2, jul./dez. 2007, p. 50-87.

DOUGLAS, Mary; WILDAVSKY, Aaron. Risk and culture: An essay on the selection of technological and environmental dangers. Berkeley, CA: University of California Press, 1982.

EGLER, C. A. G. . Risco Ambiental como critério de Gestão do Território: uma aplicação à Zona Costeira Brasileira. Território, RIO DE JANEIRO, v. 1, n.1, p. 31-41, 1996.

EL-HINNAWI, Essam. Environmental Refugees. Nairob, Kenya: United Nations Environment Programme, 1985.

GALETI, Paulo Anestar. Praticas de Controle à Erosão. Campinas: Instituto Campineiro de Ensino Agrícola, 1984. 278 p. GARCIA, Cristiano Hehr. Direito Internacional dos Refugiados – História, Desenvolvimento, Definição e Alcance. A busca pela plena efetivação dos Direitos Humanos no plano internacional e seus efeitos no Brasil. Dissertação Mestrado. UNIFLU. 2007. Faculdade de Direito de Campos – Programa de Mestrado. Disponível em: ww.fdc.br/arquivos/Mestrado/Integra/CristianoGarcia.pdf. Acesso em 20 de maio de 2011.

GUERRA, José; SILVA, Antonio; MACHADO, Rosangela. Erosão e Conservação dos solos: conceitos, temas e aplicações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010. 340 p.

96

HABTEC/OGX. Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da Atividade de Perfuração Marítima nos Blocos BM-PAMA-13, BM-PAMA-14, BM-PAMA-15, BM-PAMA-16 e BM-PAMA17, localizados na Bacia do Pará-Maranhão. Dezembro de 2009.

JUBILUT, Liliana Lyra. O Direito internacional dos refugiados e sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro. São Paulo: Método 2007. 271 p.

JUNGLES, A. E (Coor.). Atlas brasileiro de desastres naturais 1991 a 2010: volume Pará, São Paulo: 2011.

LAMPIS, A. Pobreza e riesgo medioambiental: un problema de vulnerabilidad e desarrollo. Disponível em: http://www.desenredando.org., 2010. Acessado em 25 de março de 2011.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Mariana de Andrade. Metodologia Científica. 5.ed. São Paulo (SP): Atlas.

LIEBER, R. R.; ROMANO-LIEBER NS. Causalidade e fatores de risco: transcendência e imanência na educação ambiental. Educação Teoria e Prática, São Paulo, v. 9, n.16/17, 2002. LISER – Living Space for Environmental Refugees – www.liser.org

MAGALHÃES, Sônia Barbosa. Lamento e Dor. Uma analise socio-antropologica do deslocamento compulsorio provocado pela construção de barragens. 2007. 265 f. Tese (Doutoramento em Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais) Universidade Federal do Para/Université de Paris. 2007.

MAGALHÃES, Sônia Barbosa. Refugiados ambientais (ou eco-refugiado): categoria sócio-política e reconhecimento jurídico. 2008. (Apresentação de Trabalho/Conferência ou palestra). MORAES, Sérgio Cardoso. Uma arqueologia dos saberes da pesca – Amazônia e Nordeste. Belém: UFPA/EDUFPA, 2007.

MARANDOLA JR., Eduardo; HOGAN, Daniel Joseph. O risco em perspectiva: tendências e abordagens. Geosul (UFSC), Florianópolis, v. 20, n.38, p. 23-58, 2004.

MARCELINO, E. V.; NUNES, L. H.; KOBIYAMA. Banco de dados de desastres naturais: analise de dados globais e regionais. Caminhos de Geografia, v. 6, n. 19, p. 130-149, 2006.

97

MENDES, Edivaldo. Ilha isolada é engolida. Jornal Amazônia, 18 janeiro de 2010. Disponível em: < http://www.orm.com.br/amazoniajornal/interna/default.asp?modulo=222&codigo=452592>. Acesso em: 20 mai. 2011.

MILESI, Rosita (Org.). Refugiados: realidade e perspectivas. Brasília: CSEM/IMDH; Edições Loyola, 2003. 232 p – Série Migrações. Disponível em: Acesso em: 8 agosto de 2011.

MINISTERIO DE INTEGRAÇÃO NACIONAL. Banco de dados de registro de desastres. Disponível em: < http://150.162.127.14:8080/pngr/pngr.html> Acesso em: 20 novembro de 2012.

NOBRE, Suzete Camurça, FRAXE, Therezinha de Jesus pinto, CASTRO, Albejamere Pereira de. Medicina popular e biomedicina nas práticas do cuidar da saúde na comunidade nossa senhora das graças, Manacapuru/AM. II Encontro da Sociedade Brasileira de Sociologia da Região Norte 13 a 15 de setembro de 2010 - Belém (PA)

OJIMA, R.; NASCIMENTO, T.T. do. Meio Ambiente, Migração e Refugiados Ambientais: Novos Debates, Antigos Desafios. In: IV Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ambiente e Sociedade, 2008, Brasília. Anais do IV Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ambiente e Sociedade. Campinas : ANPPAS, 2008. V. 1.

OLIVEIRA. Maria José Galleno de Souza. Refugiados Ambientais: Uma nova categoria de pessoas na ordem jurídica internacional. Revista Internacional de Direito e Cidadania, n.7, p. 123-132, junho/2010

OLIVEIRA, Luiz Antonio; OLIVEIRA Antonio Tadeu. Reflexões sobre os deslocamentos populacionais no Brasil. Estudo e Análises – Informações demográficas Rio de Janeiro, 2011.

PINHEIRO, Sandro Luis da Trindade. Relatório da Pesquisa Exploratória na ilha da Coroa Cumprida, Augusto Correa-Pará. Relatório de viagem de campo realizada em 28 e 29 de janeiro. Projeto Usos Sociais da água. Coordenado pela professora Sonia Magalhães. 2011, mimeo, 7 p.

PINHEIRO, Sandro Luis da Trindade. Juventude camponesa em unidade de conservação: O local do jovem na Reserva Extrativista Marinha Caeté do Taperaçu (Bragança, Pará). Versão preliminar de Dissertação. (Mestrado em Ciências Agrárias e Desenvolvimento Rural) Universidade Federal do Pará, Belém, 2012.

98

PEIXER, J. F. B. . O reconhecimento da categoria de refugiados ambientais pela ordem jurídica internacional: possibilidades e desafios. Meridiano 47 (UnB), v. 12, p. 23-31, 2011. RAIOL, Ivanilson Paulo Corrêa. Ultrapassando fronteiras: a proteção jurídica dos refugiados ambientais. 1. Ed. Porto Alegre - RS: Nuria Fabris, 2010. v. 1. 255 p.

RAMOS, Erika Pires; LUSTOSA, Patrícia Silveira. A crise amazônica e a ameaça à segurança ambiental global: possível cenário de refugiados ambientais para os povos da floresta. In: VIII Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica - Sessão Temática: Relações Internacional, Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (data da apresentação: 07/08/2009), 2009, Cuiabá - MT. Anais do VIII Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica - ECOECO, 2009.

RAMOS, Érika Pires. Refugiados ambientais: em busca de reconhecimento pelo Direito Internacional. 2011. 150 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.

ROSA, Benilde de Nazaré Lameira. SOMOS PARCEIROS? : representações e relações sociais na pesca em unidades de conservação - Em foco a APA da Costa de Urumajó. 2007. 171 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais), Universidade Federal do Pará, Belém, 2007.

SANTO, CELINA MARQUES DO ESPÍRITO. A gestão dos riscos naturais à erosão e inundação nos planos diretores de municípios da zona costeira (estado do Pará). 2011. 93 f. Dissertação (Mestrado em Gestão de Recursos Naturais), Universidade Federal do Pará, Belém, 2011.

SANTOS, P. L. et al. Zoneamento Agroecológico do município de Augusto Corrêa, estado do Pará. Belém: EMBRAPA Amazônia Oriental, 1999.

SEPOF. Estatística Municipal - Augusto Corrêa. Disponível em: < http://iah.iec.pa.gov.br/iah/fulltext/georeferenciamento/augcorrea.pdf >. Acesso em: 31 mai. 2011.

SILVA, A.; NEVES, S. M. A. S; NEVES, R. J. Sensoriamento Remoto Aplicado ao Estudo da Erosão Marginal do rio Paraguai: Bairro Miguel em Cáceres-MT- Brasil. Revista Geográfica Acadêmica, v. 2 n 3, p. 19-27, 2008

SILVA, C. R. B. A questão dos refugiados ambientais: Um novo desafio para o direito internacional Disponível em:< http://gedi.objectis.net/eventos1/ilsabrasil2008/artigos/dheh/brazsilva.pdf>. Acesso em: 10 mai.2010.

99

SILVA, Telma Camargo da. Corpos em perigo: uma análise sobre percepção de risco em caso de desastre radiológico. Trabalho apresentado na XXII Reunião Anual da ANPOCS, Caxambu, 1998.

SMITH, K. Environmental hazards: assessing risk and Reducing Disaster. Florence, USA: Routledge, 2000. 352p.

TAPSELL, S; MCCARTHY, S; FAULKNER, H & ALEXANDER, M (2010): Social Vulnerability and Natural Hazards. CapHaz-Net WP4 Report, Flood Hazard Research Centre – FHRC, Middlesex University, London (available at: http://caphaznet.org/outcomes-results/CapHazNet_WP4_Social-Vulnerability.pdf).

TOMINAGA, L.; SANTORO, J.; AMARAL, R. Desastres naturais: conhecer para prevenir. São Paulo: Instituto Geológico, 2009. 197 p.

UN-ISDR - International Strategy for Disaster Reduction. 2009. Terminology on Disaster Risk Reduction. Disponível em http://www.unisdr.org. Acesso em agosto de 2012. UNDP – UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME. Reducing disaster risk: a challenge for development. New York, USA: UNDP, 2004. 129 p.

VALENCIO, N.F.L.S et al . Sociologia dos desastres: construção, interfaces e perspectivas no Brasil. São Carlos, Editora RIMA, 2009. 280 p

VALENCIO et al . Implicações éticas e sócio-políticas das práticas de defesa civil diante das chuvas: reflexões sobre grupos vulneráveis e cidadania participativa. Revista São Paulo em Perspectiva, v. 20 n. 1 , jan-mar 2006 (no prelo).

VALLE JÚNIOR, R. F. do. Diagnóstico de áreas de risco de erosão e conflito de uso dos solos na bacia do rio Uberaba. 2008. 222 f. Tese (Doutorado em Produção Vegetal) Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Jaboticabal, 2008.

VILLAGRAN DE LEÓN, J. Naturaleza de los riesgos, un enfoque conceptual. Centro de Investigación y Mitigación de Desastres Naturales. Guatemala, 2002. 53 p.

100

ANEXO A: D E C R E T O Nº 763, DE 14 DE JANEIRO DE 2008 D E C R E T O Nº 763, DE 11 DE JANEIRO DE 2008. Homologa o Decreto nº 126/2007, editado pelo Prefeito Municipal de Augusto Corrêa, que declara “situação de emergência” em áreas daquele Município. A GOVERNADORA DO ESTADO DO PARÁ, no uso das atribuições que lhe confere o art. 135, inciso V, da Constituição Estadual, e Considerando, o Decreto nº 126/2007, editado pelo Prefeito Municipal de Augusto Corrêa, que declara “situação de emergência” em áreas daquele Município em decorrência das fortes chuvas que ocasionam erosões e outros prejuízos econômicos e sociais à população local; Considerando, que a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil verificou e constatou a existência de “situação de emergência” tipificada com o código NI. GTC 13.308, nos termos da Resolução nº 3 do Conselho Nacional de Defesa Civil; Considerando, que compete ao Governador do Estado homologar o referido ato, nos termos do art. 17, § 1º, do Decreto Federal nº 5.376, de 17 de fevereiro de 2005, a fim de que passe a ter validade para os fins previstos no dispositivo legal mencionado, R E S O L V E: Art. 1º Homologar o Decreto nº 126/2007, editado pelo Prefeito Municipal de Augusto Corrêa, que declara “situação de emergência” em áreas daquele Município pelo prazo de 90 (noventa) dias. Art. 2º Confirmar que os atos oficiais de declaração de situação anormal estão de acordo com os critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de Defesa Civil e, em conseqüência desta aprovação, passam a produzir os efeitos jurídicos que lhes são próprios no âmbito estadual. Art. 3º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. PALÁCIO DO GOVERNO, 11 de janeiro de 2008. ANA JÚLIA CAREPA Governadora do Estado DECRETO Nº 126/2007. “DISPÕE SOBR E A SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA EM QUE SE ENCONTRA A ORLA MARÍTIMA DA VILA DE PERIMIRIM NO MUNICÍPIO DE AUGUSTO CORRÊ A E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”. O PREFEITO MUNICIPAL DE AUGUSTO CORRÊA, no uso de suas atribuições legais conferidas pela Carta Magna, pelo Art. 73 Inciso IX da Lei Orgânica do Município de Augusto Corrêa em harmonia com o Art. 17 do Decreto Federal nº 5.376 de 17 de fevereiro de 2005 e pela Resolução nº 03, de 02 de julho de 1999 Conselho Nacional de Defesa Civil e;

101

CONSIDERANDO a influência do Oceano Atlântico na foz do Rio Urumajó, na qual margeia a Orla Marítima da Vila de Perimirim; CONSIDERANDO que determinadas marés associadas às fortes chuvas no período invernoso intensificam a erosão, com a conseqüente queda das barreiras. CONSIDERANDO que o fenômeno da erosão fluvial, provocada pelo Rio Urumajó e o das terras caídas que está assolando a Orla Marítima da Vila de Perimirim, causando inúmeros danos como desabamento do Cais de Arrimo (ou Orla Marítima), de dezenas de resistências, de um posto de saúde, de uma igreja católica e uma igreja evangélica; CONSIDERANDO que danos causados são de ordem material e, mormente, expondo a elevado grau de risco a vida dos cidadãos que lá habitam; CONSIDERANDO a imperiosa necessidade da intervenção do Chefe deste Executivo, que não dispõe de recursos próprios necessários para sanear de imediato o gravame que recrudesce a cada dia. D E C R E T A: Art. 1º A situação de emergência na Orla Marítima da Vila de Perimirim, no Município de Augusto Corrêa pelo prazo de 90 (noventa) dias. Art. 2º Todos os serviços municipais terão seu curso direcionado para resolver as situações surgidas em decorrência da erosão fluvial provocada pelo Rio Urumajó na Orla Marítima da Vila de Perimirim. Art. 3º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. Gabinete do Prefeito Municipal de Augusto Corrêa (PA), 19 de novembro de 2007. AMÓS BEZERRA DA SILVA Prefeito Municipal

102

ANEXO B: D E C R E T O Nº 2.181, DE 15 DE MARÇO DE 2010.

D E C R E T O N° 2.181, DE 15 DE MARÇO DE 2010. Homologa o Decreto nº 004, de 7 de janeiro de 2010, editado pelo Prefeito Municipal de Augusto Corrêa, que declara “situação de emergência” em áreas daquele Município. A GOVERNADORA DO ESTADO DO PARÁ, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo art. 135, inciso V, da Constituição do Estado, e Considerando os termos do Decreto n° 004, de 7 de janeiro de 2010, editado pelo Prefeito Municipal de Augusto Corrêa, que declara “situação de emergência”, em áreas daquele Município, em face da grande quantidade de chuvas associada à fortes marés na Região, intensificando a erosão fluvial, ocasionando, em conseqüência, queda de barreiras e afetando residências de famílias locais e demais prédios públicos; Considerando que a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil verificou e constatou a existência de “situação de emergência”, tipificada com o código NE.HEX 12.302, nos termos da Resolução n° 3 do Conselho Nacional de Defesa Civil; Considerando que compete a Governadora do Estado homologar referido ato, nos termos do art. 17, §1°, do Decreto Federal n° 5.376, de 17 de fevereiro de 2005, a fim de que passe a ter validade para os fins previstos no dispositivo legal mencionado, R E S O L V E: Art. 1° Homologar o Decreto n° 004, de 7 de janeiro de 2010, editado pelo Prefeito Municipal de Augusto Corrêa, que declara “situação de emergência”, em áreas daquele Município, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias. Art. 2° Confirmar que os atos oficiais de declaração de situação anormal estão de acordo com os critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de Defesa Civil e, em conseqüência desta aprovação, passam a produzir os efeitos jurídicos que lhes são próprios, no âmbito estadual. Art. 3° Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. PALÁCIO DO GOVERNO, 15 de março de 2010. ANA JÚLIA DE VASCONCELOS CAREPA Governadora do Estado DECRETO N°004 DE 07 DE JANEIRO DE 2010. Dispõe sobre a situação de emergência nas localidades de Coroa Comprida e Perimirim no Município de Augusto Corrêa e da outras providencias. O PREFEITO MUNICIPAL DE AUGUSTO CORREA. ESTADO DO PARA, no uso de suas atribuições legais que são conferidas pelo art. 73, inciso IX da Lei Orgânica Municipal, em

103

harmonia com as determinações do Ministério da Integração Nacional - Defesa Civil, art. 17 do Decreto Federal n° 5.376 de 17 de fevereiro de 2005 e Resolução n° 03, de 02 de julho de 1999, do Conselho Nacional de Defesa Civil e, CONSIDERANDO a influência do Oceano Atlântico na foz do Rio Urumajó; CONSIDERANDO que as fortes chuvas que começam a surgir no período de inverno associadas às fortes mares intensificam a erosão, provocando queda de barreiras e afetando residências de famílias locais e demais prédios públicos; CONSIDERANDO que o fenômeno da erosão fluvial esta causando deslizamento de terras e desabamento de residências, resultando em danos de ordem material, desalojamento de famílias e expondo a elevado grau dc risco a vida dos cidadãos que habitam as localidades de Coroa Comprida e Perimirim; CONSIDERANDO a imperiosa necessidade de intervenção do Chefe do Executivo Municipal com ações de resposta em vista do disposto no artigo 18 do Decreto 5.376 de 17 de fevereiro de 2005 no atendimento da situação que ocasiona prejuízos e compromete a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos e particulares; Art. 1°- Fica declarada a situação de emergência nas localidades de Coroa Comprida e Perimirim, Município de Augusto Corrêa, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias. Art. 2° - Os serviços públicos municipais serão direcionados para a resolução das situações surgidas em decorrência da erosão fluvial e fortes chuvas nas localidades. Art. 3 °- Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. Gabinete do Prefeito Municipal de Augusto Corrêa-Pa, em 07 de janeiro de 2010. AMÓS BEZERRA DA SILVA Prefeito Municipal de Augusto Corrêa

104

ANEXO DANOS.

C:

FORMULÁRIO

DE

AVALIAÇÃO

DE

105

106

107

108

109

ANEXO D: ROTEIRO DE ENTREVISTA Nome do entrevistado: ____________________________________________________ Endereço: _______________________________________________________________ Escolaridade:____________________________________________________________

1. Qual seu trabalho atual ou profissão? (A) Pescador

(C) Outros: ___________________________

(B) Aposentado 2. Há quanto tempo o senhor (a) mora na Ilha da Coroa Comprida? (A) 10 anos

(C) 30 anos

(E) 50 anos

(B) 20 anos

(D) 40 anos

(F) Nasceu na ilha e/ou Desde: ___________

3. Por que razão o senhor (a) escolheu morar aqui? (A) Trabalho

(C) Menos poluição

(B) Família vizinha

(D) Lazer

(E) Outros

4. Pensando na atual situação vivida na ilha, como você consideraria o que esta acontecendo? ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 5. Há quanto tempo o senhor (a) percebe a ocorrência de erosão hídrica? (A) 10 anos

(C) 30 anos

(E) 50 anos

(B) 20 anos

(D) 40 anos

(F) Desde: ___________

6. Considerando, todos os problemas enfrentados devido à erosão hídrica, o que o senhor considera como o maior problema? ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 7. Quais outros problemas enfrentados que o senhor (a) considera significativo? ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 8. O senhor (a) gostaria de mudar da ilha da Coroa Comprida? ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________